
Revista da CAASP Como o senhor se divide entre o Direito e o Jornalismo?
José Eduardo Faria Eu sempre fui professor de Direito e jornalista. Há uma pequena
diferença no início da carreira: eu entrei no Jornalismo antes de assistir à primeira aula de
Direito. Eu fiz vestibular aos 18 anos e entrei na Faculdade de Direito da USP, e comecei a
fazer meu primeiro estágio em Jornalismo aos 17 anos. Acabei ficando aqui (no jornal “O
Estado de S. Paulo”) esse tempo todo. Hoje sou decano da Faculdade de Direito da USP, sou
o professor mais antigo, e também nunca pensei em sair da universidade. Embora tenha
tempo para me aposentar, eu continuo dando aula na graduação e na pós-graduação.
Hoje sua atuação no Jornalismo restringe-se a temas jurídicos?
Eu fiz o estágio tradicional de Jornalismo, passei por todas as editorias. Fui repórter no
começo da carreira, depois fui repórter especial, depois fui subeditor de Economia. Dali
para frente, houve um momento em que eu me dediquei a temas jurídicos, políticos e
institucionais. Ou seja, comecei a discutir questões como crise institucional, os confrontos
entre Legislativo e Judiciário ou entre Judiciário e Executivo, a questão da judicialização da
política, a judicialização da administração pública, a questão do Direito como instrumento de
desenvolvimento econômico – com essas coisas trabalhei o tempo todo na minha carreira.
Hoje escrevo um artigo a cada mês no “Estado de S. Paulo” (é também um dos editorialistas
do jornal) e, nos últimos três anos, dos meus artigos eu diria que 95% foram sobre assuntos
relativos a interpretação do Direito, aplicação do Direito, contradições das normas e a
desadequação do sistema normativo a uma realidade muito cambiante, heterogênea e
complexa como a brasileira.
O senhor tem falado sobre a necessidade de renovação do pensamento penal nas faculdades
de Direito brasileiras. Em síntese, qual seria esse pensamento penal moderno? E por que
esse novo pensamento seria melhor que o outro?
Eu venho de uma formação teórica no campo do Direito, eu pertenço ao Departamento de
Filosofia e Teoria Geral do Direito, do qual eu já fui chefe. Eu não sou penalista, não trabalho
como advogado, e venho de uma área de uma reflexão mais aberta, teórica, uma reflexão
mais analítica.
Como professor de Filosofia e Teoria do Direito, o que eu tenho percebido é que você tem, em
função do aumento da complexidade tecnológica, da complexidade social e da complexidade
econômica, nos últimos 30 ou 40 anos, você tem o advento, primeiro, de novos tipos de
criminalidade, de uma criminalidade mais organizada, que recorre mais a equipamentos
eletrônicos, que desenvolve uma série de mecanismos de ocultação de propriedades, que
vai criando o que a gente chama de paper track - papéis que vão fazendo, como uma cebola,
uma segunda casca de papel e uma terceira casca de papel, o que torna muito difícil você
identificar os responsáveis por uma organização criminosa e seus beneficiários.
O que eu fiz foi um trabalho sociológico de observação da realidade social, da realidade
econômica e, a partir dessa realidade, observando as novas formas de criminalidade e,
de outro lado, no mesmo período, verificando como o Direito reagiu a essa mudança na
sociedade.
Basicamente, eu não estou fazendo uma análise no sentido de saber o que é melhor e o que
é pior. Eu não estou fazendo um juízo de valor - eu estou fazendo um juízo de fato. O que nós
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JOSÉ EDUARDO FARIA | ENTREVISTA