
La Catedral, misto de prisão e fortaleza do crime.
68 REVISTA DA CAASP
do acordo de extradição, mudando assim
a Constituição da Colômbia. É necessário
parar aqui e refletir: o criminoso mais
procurado do país e talvez de vários países
consegue mudar a Constituição. Para
impedir esse oroboro do mal de engolir
a todos era necessário cortar a cabeça da
serpente.
Enquanto Pablo Escobar ganhava tempo
em negociações e promessas abstratas que
não tinha qualquer intenção de cumprir,
para sua família o medo, a vergonha, a
ameaça de sequestro e morte eram bem
concretos. O filho-autor-narrador consegue
apresentar esse Janos com serenidade.
Quando estavam escondidos, pai e filho,
em uma casa cercada pela polícia, viram-se
impossibilitados de sair e comprar comida.
Após vários dias passando fome, escreve,
“em cima de uma mesa havia pouco mais
de 2 milhões de dólares em dinheiro,
mas estávamos de mãos atadas, Não
podíamos gastar um único dólar daqueles,
pois ninguém ali dentro tinha liberdade
para sair de casa. ... Ao lado de meu
pai, experimentei uma forma estranha de
‘pobreza’ extrema”.
O cerco se fechava. Alguns meses
mais tarde, Escobar escreveu uma carta
prometendo render-se, e atribuindo isso
aos desejos de seu “filho pacifista”. Juan
Pablo, então com 15 anos, implorava a
cada encontro com o pai que se rendesse
e aceitasse sua pena. Em 1992, quando
Escobar soube que seria finalmente levado
para uma prisão verdadeira, fugiu de La
Catedral. Teve diversos esconderijos, até
que ao fazer uma longa ligação telefônica
à família foi finalmente localizado e morto.
Era 1993, mas para Juan Pablo, sua mãe,
irmã e noiva, a paz veio somente em vários
anos mais tarde, na Argentina.
O que poderia ser um relato de raiva ou
vingança tardia surge como uma sucessão
de imagens de uma vida que nenhum
de nós poderia imaginar. Juan Pablo vai
além dos fatos: opina, cria hipóteses, faz
reflexões sobre o peso desta herança. É o
amor de um filho que nos dá a verdadeira
dimensão da tragédia protagonizada por
Pablo Emilio Escobar Gaviria. Logo após a
morte do pai, em 2 de dezembro de 1993,
Juan Pablo, então com 16 anos, com a mãe
e a irmã (uma criança), em uma reunião
que em tudo superava a imaginação de
Mario Puzo para salvar suas vidas, viram-se
obrigados a entregar absolutamente
tudo que possuíam aos chefes de cartel
do narcotráfico. Em seguida tiveram de
fugir da Colômbia. Países lhes negaram
visto de entrada, e do mesmo modo agiu
a Igreja Católica. Conseguiram ingressar
em Moçambique, porém a corrupção
gritante, a miséria e a imundície tornaram
impossível a permanência lá.
Com novas identidades obtidas
legalmente em um tribunal na Colômbia,
vieram ao Rio de Janeiro, mas não se
adaptaram à língua e às ruas cariocas.
Decidiram, em 1995, tentar cidadania na
Argentina. Juan Pablo, agora Sebastián
Marroquín, pôde finalmente frequentar
a universidade e trabalhar, assim como a
LITERATURA