
em valores abstratos, quando a decisão invalide ato ou negócio jurídico, a lei (art. 21) impõe
ao decisor ponderar as consequências, inclusive para regular os efeitos da sua supressão
do mundo jurídico. Já o art. 22 determina que, no direito público, a aplicação considere as
condicionantes do mundo real, sejam os obstáculos reais ou as políticas públicas (caput),
sejam as circunstâncias impositivas existentes ao tempo da prática do ato questionado (§1º).
Visa, também, a estabelecer parâmetros para o poder sancionatório estatal (art. 22, §2º) e
dar balizas de coordenação para as múltiplas competências punitivas (art. 22, §3º).
A lei toca o cerne da segurança jurídica. Nela, está a imposição de que as mudanças de
orientações e de interpretações venham acompanhadas de um regime de transição, evitando
surpresas (art. 23) e a vedação de que a nova interpretação retroaja para alcançar e desfazer
ato praticado no passado e cujos efeitos já se tiverem consumado (art. 24). Por sua vez, o
art. 26 fere o tema da consensualidade e da transação estatal. Nele, vemos, definitivamente,
superado o alegado déficit de legalidade para os acordos administrativos em geral. Para
além de autorizar expressamente a transação, inclusive mediante acordos processuais (art.
27, §2º), a lei estabelece parâmetros para estes acordos (art.26, caput e §2º).
Outro vetor da lei é evitar a judicialização e conferir responsabilidade pelas
consequências dos atos. Isso está patente, no art. 27, quando autoriza que, mesmo na esfera
administrativa, o aplicador do direito público fixe quantum, modo e forma de se compensar
benefícios ou danos decorrentes das condutas apreciadas. E exige que os envolvidos,
necessariamente, participem desta definição (art. 27, §1º). Polêmico, o art. 28 apenas reitera
o preceito constitucional quanto à responsabilidade pessoal subjetiva do agente público.
E o faz modulando o grau de culpa que pode ensejar tal responsabilidade, limitando ao
erro grosseiro. Infelizmente, o veto presidencial suprimiu da lei a definição deste conceito,
remetendo à jurisprudência fazê-lo. O art. 29 regra o poder-dever de realização de consulta
pública para edição de atos normativos. Por fim, o art. 30, aparentemente inócuo, contém
mandamento importantíssimo. Ele impõe o dever de todos os órgãos que aplicam o Direito
público de apostilar seus entendimentos em precedentes, tornando públicas e claras as
orientações gerais que adotam. Obedecida a norma poderemos evoluir, efetivamente, para
um sistema que tenha deferência aos seus precedentes.
A nova LINDB é um inestimável avanço não apenas para o direito público, mas para
a hermenêutica contemporânea. Seus efeitos ainda estão por serem estimados, mas não
serão irrelevantes. A batalha da edição da lei foi vencida pela comunidade jurídica. Agora,
começa a batalha pela sua aplicação e pela definição da jurisprudência. E isso obriga a um
convite a todos os aplicadores do direito, advogados à frente. A evolução do direito é sempre
uma obra em progresso. E coletiva.|
Floriano de Azevedo Marques Neto é professor titular de Direito Administrtativo e
72 REVISTA DA CAASP
diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
OPINIÃO