
As mídias sociais criaram uma espécie de mistura da tevê com telefone, o “um-muitos-muitos-
um”. Então, quando eu posto algo no meu feed de notícias no Facebook ou na minha
timeline no Twitter, 300 pessoas leem o que eu escrevi e, quando eu abro essas redes, sou eu
quem lê essas 300 pessoas.
Então, nós temos uma forma de comunicação que é de outra natureza e a introdução
dessa nova maneira de se comunicar colocou em questão formatos muito tradicionais de
comunicação, estabelecidos no Século XIX, como emissores centralizados da comunicação
de massa, com o papel de estabelecer e organizar o debate político. Os editores faziam
uma espécie de filtragem, selecionavam quais vozes poderiam ser ouvidas, autorizavam ou
desautorizavam essas vozes a entrar nos jornais, na televisão, no rádio. Esse papel curatorial
desapareceu.
Qual o impacto dos algoritmos de plataformas como Facebook e Google na democracia?
Eles têm um impacto, mas eu não estou entre aqueles que acham que eles têm um papel
muito relevante. Primeiro eu vou te dar um argumento do porquê, normalmente, se acha
que isso é muito relevante, para poder te dizer, depois, por que eu acho que não é tanto
assim.
Um brasileiro segue 300 contatos numa mídia social, tipicamente. Esses 300 contatos fazem
várias postagens. Então, quando eu abro meu feed de notícias, a plataforma tem que ordenar
isso e o algoritmo é quem ordena. O algoritmo é uma sequência de instruções que tenta
intuir as publicações que vão me agradar mais. Como eu não consigo ver todo dia duas mil
publicações, eu só consigo ver uma centena - é muito relevante à maneira como ele ordena.
A crítica que normalmente se faz é que esses algoritmos, por privilegiarem e tentarem por
uma série de padrões, anteciparem aquilo que eu gosto, terminam me prendendo em bolhas
ou câmeras de eco, que são os dois termos usados na literatura, que são um conjunto de
pessoas que têm posições muito semelhantes. Como eu só leio coisas muito semelhantes,
termino reforçando as minhas posições e a nossa sociedade vai ficando cada vez menos
heterogênea.
Eu não acho que essa critica seja muito pertinente. O papel dos algoritmos é muito menor
do que se crê. Os estudos mostram que nós temos esse comportamento fora das mídias
sociais. Se você é uma pessoa de esquerda, você tem amigos de esquerda. Se você é de direita,
você tem amigos de direita. Se você gosta de cultura, você tem amigos que são da cultura.
Se você gosta de música pop,
seus amigos também gostam
de música pop. São essas as
pessoas com quem você fala
mais frequentemente, com
quem você sai para jantar, que
frequentam sua casa. Então,
esse fenômeno de a gente
se aproximar de pessoas que
são mais parecidas conosco,
do ponto de vista cultural e
político, não foi inventado
8 REVISTA DA CAASP
“OS EDITORES FAZIAM UMA
ESPÉCIE DE FILTRAGEM.
ESSE PAPEL CURATORIAL
DESAPARECEU.”
PABLO ORTELLADO | ENTREVISTA