
que estava na sociedade e não era representada pelos meios de comunicação finalmente ia
ter voz, ia conseguir se expressar. Essa era a expectativa.
Qualquer literatura dos anos 90 sobre internet é otimista. O que aconteceu, no entanto,
a meu ver, foi que esse fenômeno da polarização político-ideológica e do alinhamento
reduziu a diversidade que se esperava para o sistema. Por exemplo, se você olha os veículos
hiperpartidários que movem metade dos compartilhamentos nas mídias sociais hoje,
qualquer um deles, na esquerda ou na direita, são muito, muito, muito menos diversos do
que um grande jornal.
Historicamente, a imprensa alternativa era portadora de diversidade. O Pasquim trazia
nova cultura, novos músicos, novos chargistas, novos fenômenos políticos e sociais que
a grande imprensa não acompanhava. Era papel da imprensa alternativa trazer a público
coisas que não eram capturadas por esse sistema que estava fechado. E, hoje, quando a
gente olha, é o contrário.
Se você olha para essa imprensa, que vamos chamar de alternativa, mas que são esses sites
hiperpartidários, tanto de esquerda quanto de direita, você não aprende mais. Você aprende
menos! Porque a função deles, basicamente, é ficar traduzindo o que foi apurado por outros.
Eles usam como fonte a grande imprensa e traduzem aquilo para as narrativas políticas que
já são pré-estabelecidas. E quem acompanha só isso tem uma leitura da realidade muito -
não é pouco não - muito mais pobre do que quem lê a Folha (de S. Paulo), o Estado (O Estado
de S. Paulo) ou O Globo. Então essa promessa emancipatória virou no seu avesso.
Isso não quer dizer que para além desse sistema de comunicação hiperpartidário não
tenha mais voz. Tem um monte de coisas novas acontecendo, mas a verdade é que essas
experiências mais diversas são muito periféricas e o que tem relevância social é essa mídia
hiperpartidária.
Há cerca de um ano, o grupo de pesquisa que o senhor coordena na USP, Monitor do Debate
Político no Meio Digital, foi vítima de fakes news. Pode explicar a origem do boato e as suas
consequências ainda nos dias de hoje?
Aquela fake news já instruiu até uma ação do presidente do TSE, acho que na época era o
(Luiz) Fux, mas não teve nenhum impacto, porque não era algo que nos envergonhasse. Era
uma informação errada. Vou contar a história.
Uma associação de gestores de políticas públicas pegou os sites que nós monitorávamos
- eu não lembro o número exato de sites que monitorávamos, mas era uns trezentos -,
selecionou alguns e fez uma lista de sites de má qualidade e divulgaram isso.
De uma lista de sites de má qualidade feita por uma associação virou um ranking feito pela
Universidade de São Paulo dos sites que mais fazem notícias falsas. Nisso, uma porção de
sites, desses hiperengajados, começou a reproduzir e a gente mediu. Eu já não me lembro de
cabeça os números, mas foram milhões de pessoas impactadas. Eu dei duas entrevistas para
televisão, ou seja, para uma estrutura jornalística profissional em que a pauta do jornalista
tinha essa informação, para você ter ideia.
Desmentimos várias vezes essa lista e todos os nossos desmentidos somados não deram
10 mil compartilhamentos. Quando chegou ao ponto de o ministro Fux mandar serem
tomadas providências quanto a atuação desses sites, a gente achou que essa lista tinha
REVISTA DA CAASP 15
ENTREVISTA | PABLO ORTELLADO