Entrevista: Maria Almeida Mendes de Oliveira, advogada 500 mil

Por Paulo Henrique Arantes

Em 3 outubro 2023


 

 

Com apenas 23 anos de idade, a baiana Maria Almeida Mendes de Oliveira, natural de Salvador, já acumula muitas conquistas. É formada em Direito e mestranda em Direito Constitucional pela PUC SP. Já publicou seu primeiro livro, junto com Silvia Pimentel, professora da mesma escola e integrante da Comissão das Mulheres Advogadas da Seção de São Paulo da OAB. Além disso, sua jornada na advocacia começa carregando um forte simbolismo: ela é dona da Carteira da OAB SP número 500 mil.

 

A reportagem da CAASP conversou com Maria Almeida Mendes de Oliveira para trazer aos leitores o perfil de uma profissional que compõe a nova advocacia, uma advocacia que escolheu a profissão para ajudar a tornar a sociedade mais justa.

 

 

CAASP - Como surgiu seu interesse pela advocacia, dentre tantas carreiras que o Direito abrange?

 

Maria Almeida Mendes de Oliveira - Por muito tempo fiquei em dúvida entre Ciências Sociais e Direito. O processo do vestibular foi bem confuso e acabei passando em segundo lugar em Ciências Sociais na Universidade Federal da Bahia, mas a minha menina dos olhos sempre foi a PUC-SP. Desde os 15 anos eu tinha vontade de estudar lá. Uma prima havia se formado em Direito na instituição e falava muito bem do curso. Meus pais também estudaram em São Paulo e me incentivaram muito a ir atrás desse sonho.

 

 

E como foi o processo para alcançar esse sonho?

 

Fiz a inscrição no vestibular de Direito da PUC, passei, mas não pensava em me tornar advogada, no começo apenas buscava uma profissão que se encaixasse com o meu perfil e desse um bom retorno financeiro. O primeiro sinal de que estava no caminho certo veio logo no início: me encantei pelas primeiras matérias do curso, aquelas de que geralmente o pessoal não gosta, como Filosofia e Teoria Geral do Direito. Foi através dessas matérias que conheci a professora Silvia Pimentel, que é uma feminista histórica e coordenadora do Núcleo de Direito Constitucional da Pós-Graduação em Direito da PUC-SP. Ela me mostrou que podemos utilizar o Direito como uma forma de alcançar uma sociedade igualitária.

 

 

Como você se encontrou de fato na advocacia?

 

Sou muito voltada para a área acadêmica. Me inspiro muito na professora Silvia, com quem descobri a perspectiva de estudar o direito das mulheres e trabalhar com isso academicamente. Tenho essa trajetória dentro da minha graduação. Gosto muito de dar aula, já fui monitora de quatro matérias diferentes e, concomitantemente, estagiei em alguns lugares que me deram a oportunidade de seguir a linha onde o Direito é uma ferramenta de mudança para as pessoas. Meu primeiro estágio foi no Escritório Modelo D. Paulo Evaristo, onde consolidei a ideia de que podemos trabalhar ajudando as pessoas.

 

Também trabalhei no fórum, com juízes, mas esse lado do balcão não se encaixa no meu perfil. Cheguei a estagiar em um grande escritório de Direito Penal Econômico, o que foi muito bom para conhecer o meio empresarial. O meu último estágio, o mais interessante, foi em um escritório menor, voltado para a garantia dos direitos das mulheres em casos de Direito Civil, Penal e até Eleitoral. O conhecimento que agreguei durante esse período foi importante para a minha formação.

 

 

O que a Carteira da OAB simboliza para você?

 

Demorei um pouco para buscar a Carteira da OAB porque ia iniciar o mestrado. Resolvi sair do estágio para seguir a carreira acadêmica, mas surgiram casos de amigas próximas que estavam com problemas relacionados a questões de gênero, importunação sexual e outros problemas que são resolvidos judicialmente. Então, senti necessidade de tirar a Carteira da Ordem para atuar nesses casos. Comecei na carreira de advogada autônoma, sem tirar o foco do meu mestrado, mas buscando usar o Direito como uma ferramenta alinhada aos meus princípios. A Carteira da OAB virou um meio de colocar na prática aquilo que estudo na teoria.

 

 

Qual foi o sentimento de receber a Carteira número 500 mil

 

Quando me contaram, achei que era trote, mas depois a ficha caiu e me senti muito honrada em fazer parte desse marco tão importante para a OAB SP. O número da Carteira não me faz melhor que ninguém, mas mostra como a comunidade de advogados em São Paulo é grande - e me sinto sortuda por fazer parte dela. A sensação de fazer parte de algo tão grande é indescritível, é um sinal de que as pessoas estão se formando em Direito no Estado de São Paulo, que estão passando na prova da OAB e que está acontecendo uma integração no mercado de trabalho. 

 

 

Receber a Carteira da OAB mudou a sua rotina?

 

Um detalhe que achei engraçado ao receber a Carteira de número 500 mil é que muitas pessoas passaram a me seguir no Instagram. Não sei exatamente o que esperam ver por ali, mas achei interessante descobrir que os advogados são uma classe que oferece uma rede de apoio para quem está começando, porque eu achava que advogar sozinha e sem um escritório seria solitário, porém a Carteira da OAB te coloca dentro de um universo em que as pessoas estão ali para te ajudar.  Percebi ser muito importante essa sustentação nesse começo de carreira.

 

 

Falando do mercado de trabalho, quais as suas expectativas para o futuro da sua carreira? 

 

No momento estou buscando meu título de mestre em Direito Constitucional, mas meu intuito é trabalhar com o Direito das Mulheres, uma demanda pungente.  O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) vem realizando alterações importantes para garantir esse respaldo, mostrando que mais mulheres estão tomando consciência de seus direitos. Tenho uma preocupação maior sobre a forma que o trabalho acontece na advocacia, o que é um desafio para muitos, pois, eu, Maria, tive boas experiências estagiando e trabalhando, mas vejo alguns colegas que emendaram o estágio com a efetivação assim que se formaram e sofrem uma grande pressão, principalmente por sermos jovens dentro da advocacia. Os grandes escritórios possuem uma grande demanda para poucos contratados, o que impossibilita a visão de crescimento. Minha preocupação é com a mercantilização da profissão e sobre como se tornou lucrativa para quem atua há muito tempo e esmagadora para quem está começando.

 

 

A CAASP auxilia advocacia de diversas formas, inclusive a jovem advocacia. Você, como uma nova advogada, pretende se inserir dentro do braço assistencial do Universo OAB?

 

Confesso que tenho o interesse de conhecer mais sobre a CAASP, e o que venho aprendendo até agora sobre a entidade me animou muito. Temos direitos a muitos benefícios, recentemente descobri sobre as farmácias e adorei saber que temos descontos. Os serviços que a Caixa de Assistência disponibiliza para nós no dia-a-dia ajudam muito e com toda certeza adoraria me integrar mais nas causas defendidas. Como faço parte da Comissão das Mulheres Advogadas da OAB SP, irei participar da Conferência Regional que ocorrerá na Capital -  será uma ótima oportunidade para conhecer mais sobre a CAASP.

 

 

Poderia deixar uma mensagem para a jovem advocacia e para os estudantes de Direito? 

 

Os advogados possuem um papel importante dentro do Estado Democrático de Direito, conhecemos como ele funciona e somos capazes de levar esse conhecimento para outras pessoas. Mesmo seguindo uma carreira clássica do Direito ou atuando como um advogado tradicional, é bom saber que nós somos pessoas com poder de mudar a sociedade. É preciso ter consciência das questões de raça, classe e gênero para pluralizar a nossa atuação no Direito. Um exemplo atual é o debate do STF sobre a ocupação da vaga: nossa reivindicação é que uma mulher negra tome posse do cargo.

 

FOTO: RICARDO RAD.


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