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Revista da CAASP - Edição n° 28

extensão da gravidade é maior, porque toda a sociedade está imediatamente comprometida com aquele ato lesivo. Poderíamos imaginar que o sujeito que faz a primeira faz também a segunda. É onde eu queria chegar. Existe uma tentação até de fazer disso uma escala escolar: o indivíduo começa furtando o lápis do colega, colando na prova, fazendo-se valer de artifícios para saber as questões da prova, depois ele consegue um jeito de comprar uma vaga numa universidade, depois ele frauda um diploma, e assim ele entra numa espécie de escolaridade em que estará emocionalmente preparado, cascudo e imune ao medo para alçar voos mais arrojados do ponto de vista de ganhos e de pretensões. Porém, não resta dúvida de que por trás de tudo está a canalhice, que é dar primazia à própria vantagem através de conduta que lesa e agride a convivência. Você pode ter um canalha de pequeno porte ou um canalha de grande porte. Falta coragem ao canalha de pequeno porte para ir além? Ou falta coragem, ou faltam recursos, ou falta oportunidade. Mas o fato é que por detrás do pequeno e do grande porte, de mais relevante, está a canalhice. Um exemplo que eu adoro: quando você percebe que é desconfortável, estando numa piscina, ter que sair da piscina para urinar fora dela, você então pensa na possibilidade de urinar dentro da piscina. O fato de haver pessoas ali nadando, e portanto pessoas que passam a nadar na sua urina, tem valor menor do que a preservação do conforto de você não ter que sair da piscina para urinar fora dela. Esse é o modus operandi de um canalha clássico: um sujeito que aceita perfeitamente que a falta de higiene dele tenha que ser suportada pelos demais em nome do seu próprio conforto. E por que esse exemplo é excelente? Porque AQUELE QUE FURA FILA NO RESTAURANTE mostra o quanto a canalhice é uma tentação. Esse sujeito, além de canalha, é também um porco - não? -, pois fica nadando na água suja de urina. É, mas você sabe que, digamos, é muito mais tolerável sujar-se com os próprios excrementos do que com os excrementos alheios (risos). No final das contas, tudo isso é indicativo de uma certa pobreza civilizatória. Esse indivíduo que, adulto, urina na piscina, se ele faz isso é porque ao longo da sua trajetória o mundo não o civilizou adequadamente no sentido de respeitar os demais nadadores. Há aí um fracasso civilizatório que deve ser estudado. Parece-me que a maioria absoluta da população brasileira ficou indignada com a corrupção recentemente revelada. No entanto, as panelas pararam de bater, mesmo com todos os principais nomes do atual governo sendo reiteradamente citados nas delações, além de terem participado de todos os governos anteriores. Por que isso acontece? Talvez porque a real motivação para as manifestações de rua não fossem propriamente o combate à corrupção. Se você me diz que a corrupção continua e os panelaços acabaram, 12 REVISTA DA CAASP CLÓVIS DE BARROS FILHO | ENTREVISTA AJUDA A PATROCINAR UMA SOCIEDADE INJUSTA, SUBVERTE UM CRITÉRIO ÓBVIO DE DISTRIBUIÇÃO DE RECURSOS


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