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Revista da CAASP - Edição 26-

ilusão é achar que só beneficia os ricos. Eu escrevi sobre o lado oculto dos números da presunção da inocência. Eu expus dados estatísticos mostrando que réus da Defensoria Pública, pobres, também se beneficiam e muito disso. Na verdade, há um percentual enorme sobre presunção da inocência que extrapola o cumprir ou o não cumprir a pena. Quem é do Direito sabe muito bem que, se o tribunal fixar mal uma pena em regime fechado, ele sai cumprindo de cara; se se modifica depois para regime semiaberto ou aberto, ele cumpriu erradamente. Como é que faz? Num país que tem 640 mil presos, dos quais aproximadamente 320 mil são provisórios... o próprio Supremo Tribunal não acabou de declarar, entre aspas, inconstitucional o sistema prisional? Agora está criando mais condições para que mais pessoas sejam presas. O que senhor achou das 10 propostas contra corrupção elaboradas pelo Ministério Público, as quais estão sendo apreciadas no Congresso? Eu fui à Câmara e fiz um depoimento no dia da posse da ministra Carmem Lúcia. Coloquei lá minha posição de contrariedade em relação à maioria das propostas, porque são nitidamente punitivistas, quebram garantias. Por exemplo, a tentativa de enfraquecer o habeas corpus é uma coisa estarrecedora, depois de tudo que a civilização lutou pelo habeas corpus. Por incrível que pareça, o Ministério Público, como guardião da cidadania, com tudo que seu papel representa... eu fico impressionado com a coragem do Ministério Público de querer enfraquecer o remédio heroico – o habeas corpus é o remédio heroico, “traga-me o corpo”, do Século XIII. Mas talvez o ponto mais absurdo de todos seja o teste da integridade, que eu chamo de fator minority report, como naquele filme em que o sujeito era punido antes de cometer o crime, porque existia um modo de saber que ele ia cometer um crime. Além disso, a transformação de alguns crimes em crimes hediondos ou o aumento das penas por corrupção a mais de 20 anos, o dobro do homicídio. Eles estão mais preocupados com a corrupção ou com o patrimônio do que com a vida das pessoas. Não é papel do Ministério Público fazer propostas anticorrupção do modo como foi feito, isso é papel do Parlamento. Não são proibidas iniciativas populares, mas não me parece que devam ser feitas em conjunto, aproveitando uma certa onda que se criou de ser contra a impunidade. 14 REVISTA DA CAASP LENIO STRECK | ENTREVISTA


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