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Revista da CAASP - Edição 26-

Isso é verdade. Trata-se de uma visão política e moral do Supremo Tribunal sobre o direito à presunção da inocência. Não é uma visão jurídica. O que nós vamos dizer para os nossos alunos nas faculdades de Direito quando alguém perguntar qual o significado de determinados termos? O Direito tem limites na interpretação. Eu estou na Itália falando sobre interpretação, e uma professora me diz: “ah, professor, o senhor fica falando sobre interpretação, o senhor defende a possibilidade de que sempre haja uma resposta correta, o senhor tem uma atitude ortodoxa”. Ela prossegue: “vou dar um exemplo: nós dois olhamos um barco, cada um de nós vê um barco diferente”. Então, eu digo a ela: “começamos bem, professora. Nós dois vemos um barco, não um avião, nem uma bicicleta”. São limites semânticos. O Supremo tem limites. Os próprios ministros, se olharem os votos durante sua história, há momentos em que eles dizem “a Constituição tem limites que precisam ser respeitados”. Na hora de votar este caso, no entanto, a política e a moral falaram mais alto. Mas vamos a uma questão de ordem prática. A medida ajuda a combater a corrupção? Claro que não. Não ajuda a combater a corrupção, pode sim ajudar a botar mais gente na cadeia. Primeiro, essa questão da presunção não está ligada à Lava Jato. Os réus da Lava Jato não se beneficiam nem serão prejudicados por ela. Na visão externa do observador, do torcedor, isso pode fazer bem para o país. Não dá para entrar na armadilha do “isso faz bem ou faz mal”. Essa é uma visão que o sociólogo ou alguém do povo deve ter, daí a minha ortodoxia. A minha resposta para o tema tem que ser jurídica. A Constituição diz que a presunção da inocência é um princípio, o Artigo 283 do Código de Processo Penal explicita isso, e a partir disso eu tenho que esgotar todos os recursos para então fazer o cumprimento da pena, o que não quer dizer que o sujeito preso não possa continuar preso se recorrer para o STJ e para o STF – se existem requisitos para a pessoa estar presa em função de preventiva etc., eles valem. Criou-se uma espécie de lenda urbana, como se isso fosse o prenúncio da impunidade, e outra REVISTA DA CAASP 13 ENTREVISTA | LENIO STRECK (CUMPRIMENTO DE PENA ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO:) TRATA-SE DE UMA VISÃO POLÍTICA E MORAL DO SUPREMO. NÃO É UMA VISÃO JURÍDICA.


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