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Revista da CAASP - Edição 23

instrumentos subservientes ao “alto clero” do Parlamento. É amiúde uti-lizado para a aprovação das proposições de interesse do Executivo e dos órgãos de direção parlamentar integrantes da base de sustentação do governo, que comumente o definem em proveito da coalizão partidária estabelecida com base na distribuição de cargos administrativos comis-sionados 72 REVISTA DA CAASP e favores a correligionários. Segundo levantamento de cientistas políticos2, mais de 80% dos projetos aprovados pelo Parlamento têm origem no Executivo. A maio-ria segue o regime de urgência, rito regimental que restringe o tempo de discussão e a oportunidade para o aperfeiçoamento da matéria por meio de emendas e limita o conhecimento público das razões e das posições do governo, da base que lhe dá apoio e dos diferentes partidos relativamente às proposições, aos seus objetivos, aos seus efeitos, e às críticas e alternativas que a elas se lançam. Sob o prisma democrático, no entanto, o governo deveria enunciar as suas razões em um debate público e discuti-las em contraposição com as teses da oposição. As dis-cussões deveriam ser amplas, durar um tempo razoável e observar os postulados da contradição e do diálogo. Um bom procedimento leg-islativo – e o regime regimental de urgência não o é – há de assegurar o conhecimento prévio das pautas e propiciar espaços e tempos ade-quados para a negociação, para o convencimento e, se possível, para a confluência entre pontos de vista originariamente confrontantes. Afinal, o Parlamento é uma arena plural e, por isso, tem de estar aberto à com-posição de interesses. É necessário democratizar o Parlamento brasileiro. É necessário desconcentrar as extraordinárias competências que os órgãos diretivos das Casas Legislativas detêm por ranço de um modelo orgânico-estru-tural parlamentar haurido da ditadura que vigeu no País por mais de 20 anos. É necessário atentar para as disposições contidas nos regimentos parlamentares, que de há muito deixaram de tratar apenas de órgãos e processos interna corporis; hoje, projetam-se por outros órgãos con-stitucionais e pela sociedade. São exemplo disso as sugestões de me-didas legislativas que a Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, criada regimentalmente, recebe de sindicatos e enti-dades organizadas da sociedade civil. É necessário rever e atualizar a disciplina regimental de temas como processo legislativo (v.g., a acen-tuada desigualdade de direitos e prerrogativas entre parlamentares lí-deres e não líderes e a excessiva influência dos partidos e seus caciques nas decisões legislativas), processo orçamentário (v.g., a possibilidade de utilização de emendas individuais ao projeto de lei orçamentária anual como instrumento de barganha política) e controle parlamentar (v.g., a criação de CPIs, pela maioria parlamentar, com a finalidade de conter ou fraudar o poder de fiscalização das minorias). Por que as minorias no Brasil não contam, como em Portugal, com OPINIÃO


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