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Revista da CAASP - Edição 23

DEMOCRATIZAR O PARLAMENTO “Quantos de nós, em tantos momentos de votação na Câmara, perguntamos o que está sendo votado ou como se vota?” - foi a per-gunta que o então deputado federal e ex-ministro do STF Nelson Jobim1 fez, em 1991, ao se referir à figura do “parlamentar periférico” (também conhecido como do “baixo clero”), isto é, aquele parlamentar que se vê colhido pelas decisões tomadas à sua revelia pelas presidências, mesas, colégios de líderes e lideranças das Casas Legislativas, e que vota o que e quando esses órgãos resolvem, sem deter elementos informativos aptos à formação de opinião acerca da matéria objeto de deliberação. Ora, se é verdadeiro que vivemos em um Estado Democrático de Direito, que tem dentre os seus fundamentos o pluralismo político, como pode um representante do povo ver-se subjugado por outros rep-resentantes REVISTA DA CAASP 71 do povo? Pode validamente existir, no Brasil, uma estrutura orgânico-funcional parlamentar hierarquizada, onde poucos mandam e muitos obedecem? Nas eleições, votamos em classes distintas de repre-sentantes: a de sobrerrepresentantes e a de sub-representantes? Essa distorção, que é real e atual, não decorre de nenhum coman-do constitucional, pois, de acordo com a Constituição da República, o Poder Legislativo rege-se, no que tange à sua composição, pelo princí-pio da igualdade: todos os seus integrantes exercem a representação política da sociedade e têm os mesmos direitos, deveres, prerrogati-vas, vedações, responsabilidades e incompatibilidades. A igualdade constitucional dos parlamentares radica-se no valor do seu voto, que é idêntico ao dos demais e projeta-se na possibilidade de participar dos trabalhos e dos debates, imprescindível ao desempenho das atribuições inerentes ao mandato representativo. O peso de cada representante nas decisões parlamentares, assim, deveria ser o mesmo, mas, na práti-ca, não é. São os regimentos parlamentares, esses diplomas tão descon-hecidos da sociedade brasileira, que estabelecem as regras do jogo político, ordenam as relações internas das Casas Legislativas com seus componentes e disciplinam a forma pela qual elas desempenham es-pecificamente as suas competências constitucionais, como a legislativa e a controladora. É nos textos regimentais que se encontra a origem da centralização decisória e dos superpoderes que os órgãos de cúpula reúnem, que tanto desigualam os parlamentares, sufocam o direito de oposição política e o pluralismo e depreciam a representatividade políti-ca no País. O regime regimental de urgência, por exemplo, é daqueles OPINIÃO


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