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Revista da CAASP - Edição 21

Como o senhor resumiria o trabalho do STF no julgamento do Mensalão? Eu presidi o julgamento da Ação Penal 470 até o fim, praticamente. O ministro Joaquim Barbosa, que assumiu a presidência no final, julgou só réus avulsos. Sob minha presidência foram julgados todos os réus integrantes da espinha dorsal do processo, constituída por três núcleos: político, publicitário e financeiro. Quando eu deixei a presidência do STF, eu já havia julgado e dosimetrado a pena de todos os partícipes desses três núcleos. Então, me sinto muito à vontade, muito seguro para falar. Como julgadores da Suprema Corte do país, nós cumprimos bem o papel de não praticar o Direito Penal do inimigo, que condena por antecipação, e nem o Direito Penal do compadrio, que é o inverso, é o das interpretações mais do que lenientes, é o das interpretações cúmplices. Metaforicamente, como todo poeta gosta: nem rajas de sangue no olho, nem ramalhete de flores nas mãos. A imprensa brasileira tem lado nessa história toda? Eu sempre que falo da imprensa procuro ser coerente com os votos que proferi no Supremo sobre liberdade de expressão. Foram três votos emblemáticos. O primeiro, que me acarretou muita crítica, foi o do caso Elwanger, um escritor e editor gaúcho processado por crime de racismo contra o povo judeu, sob acusação de proselitismo nazista. Ele entrou com habeas corpus, e eu concedi o habeas corpus. O ministro Marco Aurélio me acompanhou. Eu concedi no sentido de que ele fez uso da sua liberdade de expressão. Foi ali que eu lancei o trocadilho: a liberdade de expressão é a maior expressão da liberdade. E citei uma frase atribuída dominantemente a Voltaire: “Não concordo com nenhuma das palavras que dizeis, mas defenderei até a morte vosso direito de dizê-las”. Quando do julgamento da ação que postulava a não recepção da Lei de Imprensa do período militar, meu voto foi acolhido no sentido de mandar para as calendas gregas aquela lei e consagrar a plenitude da liberdade de imprensa no país. Desde que os livres manifestantes arquem com as consequências de eventuais mentiras, não? Perfeito. Não é pelo temor do abuso que se vai proibir o uso. Quem quer que seja pode dizer o que quer que seja, respondendo pelos abusos civil, penal, administrativamente. Bem, o terceiro voto dos quais eu falava foi relacionado à apelidada “Adin do humor”, sobretudo em época de eleição. E meu voto também foi confirmado no seguinte sentido: é justamente em época eleitoral que a liberdade de expressão mais serve ao cidadão eleitor. Eu sempre vejo a imprensa muito mais pelo lado positivo. Eu acho que sem a imprensa teríamos muita dificuldade para conhecer os bastidores do poder. A imprensa existe para controlar o Estado, e não o Estado para controlar a imprensa. A imprensa não deveria ter lado, mas tem o direito de ter. Mas a imprensa brasileira não assume o lado, preferindo posar de imparcial... Ah, sim. Mas, em linhas gerais, a imprensa tem dado uma contribuição inestimável para esse elemento conceitual da democracia chamado “transparência”, para o desnudamento das coisas do poder. Fevereiro 2016 / Revista da CAASP // 9


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