Page 18

Revista da CAASP - Edição 21

ESPECIAL \\ Em 2011, Cristovam Buarque enviou seu projeto detalhado, acompanhado de uma carta, à presidente Dilma Rousseff. “Eu entreguei nas mãos da ministra Gleisi Hoffman (então titular da Casa Civil) e esqueci de pedir o protocolo. Nunca obtive nem sequer um recibo”, contou à Revista da CAASP. Arquivo Alunos EEFDP Alunos da Escola Fernão Dias: renascimento do movimento estudantil 18 // Revista da CAASP / Fevereiro 2016 // A queda de braço paulista No fim de 2015, o Governo do Estado de São Paulo anunciou um plano para reorganizar as escolas em 2016, com a transferência de mais de 300 mil alunos de suas atuais unidades de ensino. O objetivo era distribuir os alunos de acordo com as séries, com estudantes do ensino fundamental em unidades separadas dos alunos do ensino médio. Na prática, essa distribuição acarretaria o fechamento de 93 escolas, que, segundo o governo, seriam destinadas a outra atividade pública. Em muitas unidades, os alunos reagiram. Teve início uma onda de protestos que, primeiro, aconteceram nas ruas, com o bloqueio de importantes vias em São Paulo. O auge das manifestações aconteceu com a ocupação de pelo menos 195 estabelecimentos de ensino em todo o Estado. Depois de quase dois meses com as escolas ocupadas, o governo anunciou a suspensão do plano e o secretário de Educação, Herman Voorwald, deixou o cargo. “A maior conquista foi o renascimento do movimento estudantil em São Paulo”, comemorou Heudes Cássio da Silva Oliveira, de 18 anos, aluno do terceiro ano do ensino médio da Escola Estadual Fernão Dias Paes, em Pinheiros. “Tentaram enfiar goela abaixo um plano que era para cortar verbas da educação, não era para melhorar nada”, acrescentou Letícia Karen, de 16 anos, que faz o primeiro ano do ensino médio na mesma escola. Os dois conversaram com a Revista da CAASP no dia 9 de janeiro, um sábado, logo após as atividades de reposição de aulas no colégio que se tornou símbolo do movimento dos estudantes. Como o colégio permaneceu quase dois meses fechado, com a perda de 28 dias letivos, a reposição aconteceu no mês de janeiro e, mesmo sendo este um mês de férias, a frequência foi elevada. “É inegável que houve uma mudança de mentalidade, com os alunos assumindo o papel de protagonistas da educação”, diz uma professora que acompanhou uma das atividades dos alunos no sábado de reposição. Os estudantes colocaram cadeiras na área coberta do pátio e, durante duas horas, fizeram um balanço do movimento e tiveram a oportunidade de ouvir dois jovens chilenos que, em 2006, eram estudantes secundaristas e ocuparam as escolas naquele país, num movimento que ficou conhecido como A Revolução dos Pinguins. Francisco Toledo e Fernando Araya Salazar, hoje professores, contaram que a educação no Chile mudou depois desse período de ocupação, com o início da reforma do ensino, com a divisão em dois ciclos, o primeiro, fundamental, de seis anos e o segundo, o médio, de outros seis. Heudes e Letícia são jovens que moram na periferia e veem na escola a oportunidade de ascensão social. Heudes é de Embu das Artes, o pai trabalha como porteiro e a mãe é balconista numa lanchonete. Heudes quer ser advogado e já tem até a faculdade dos seus sonhos: o Largo São Francisco. O pai de Letícia é segurança e a mãe, dona de casa. Ela mora na região da rodovia Raposo Tavares, é a mais velha de três irmãs e seu projeto de vida é se formar em História. Os dois foram para o Fernão, em Pinheiros, em busca de um ensino melhor. Nas escolas de sua região, são frequentes os casos de tráfico e de desrespeito aos professores. Pelas carteiras escolares do Fernão passaram celebridades como o jornalista Clóvis Rossi e o psiquiatra e educador Içami Tiba, falecido no ano passado. No hall, existem placas de antigas turmas, como a de 1948, ano da fundação da escola. Os estudantes da época entregaram 50 anos depois, na comemoração do Jubileu de Ouro, uma placa de bronze para homenagear os professores, repetindo feito de 25 anos antes, na comemoração do Jubileu de Prata, com uma placa que registra o nome do governador da época, Laudo Natel. A tradição se manteve em 2007, com a afixação da placa sobre o Jubileu de Diamante. Imortalizada também foi a palestra que a escritora Rachel de Queiroz realizou ali no dia 27 de maio de 1992, conforme informa outra placa afixada na escada que leva ao piso superior.


Revista da CAASP - Edição 21
To see the actual publication please follow the link above