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Revista da CAASP - Edição 21

ESPECIAL \\ A solução, para Eunice Durham, passa pela criação da carreira de professor de dedicação integral. “O professor permaneceria na escola, e não haveria esse número enorme de transferências”, aposta. No campo do financiamento, o Fundef (Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental), criado no governo FHC, foi uma iniciativa revolucionária, pois distribuiu equitativamente os recursos da educação, blindando-os contra ingerências políticas. “Era preciso fazer uma redistribuição das responsabilidades, de modo a tornar estados e municípios conjuntamente responsáveis pelo ensino fundamental. E isso foi feito”, recorda Eunice Durham, uma das formuladoras do modelo. O Fundef, porém, restringia-se ao ensino fundamental. Ao substituí-lo pelo Fundeb (Fundo Nacional da Educação Básica), o governo Lula ampliou o sistema para a educação infantil e o ensino médio. “FHC e Lula deram andamento ao desafio da Constituição de 1988 de incluir todas as crianças na escola. De fato, houve a inclusão, mas eu penso que estamos patinando na definição de um modelo de escola que seja afeito ao Século XXI. Não se pode manter as crianças de hoje, que vivem conectadas à internet, em frente ao quadro negro, sentadas em fila. Nossa escola continua como era no Século XIX”, avalia Pilar Lacerda. Ampliado o acesso, permanece o notável baixo nível da massa estudantil brasileira. As pérolas redigidas nas provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e em outros vestibulares são o retrato cômico, se não trágico, dessa realidade. Não são raras sentenças como esta: “A Segundo Guerra Mundial foi um período de paz e prosperidade para a Alemanha”. Ou esta: “Uma tonelada pesa pelo menos 100 quilos de chumbo”. Ricardo Bastos Eunice Durham: “é inconcebível uma greve de professores que dure meses” 16 // Revista da CAASP / Fevereiro 2016 Uma pesquisa da Fundação Lemann, rompante de cidadania do bilionário Jorge Paulo Lemann, feita perante jovens de 20 e 21 anos, empregadores, especialistas em educação, professores universitários a representantes de organizações da sociedade civil, concluiu que “existe uma grande desconexão entre os conhecimentos e as habilidades exigidos na vida adulta e o que é ensinado na escola”; os jovens “sentem-se mal orientados e pouco preparados para lidar com desafios cotidianos tanto na faculdade quanto no trabalho”; e os professores, empregadores e membros de ONGs “sentem falta de competências básicas nos jovens que acabaram de se formar e com os quais interagem”. Em síntese, segundo constatou a Fundação Lemann, “os jovens não conseguem interpretar o que leem, sentem dificuldade para escrever textos simples do dia a dia e não sabem expressar ideias e argumentos oralmente”. Daí a se questionar o valor do volumoso ingresso de estudantes no ensino superior nos últimos anos, proporcionado pela criação de dispositivos como o Prouni (Programa Universidade para Todos), o Reuni (Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) e o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil). Mesmo com a expansão do acesso à universidade, apenas 16% dos trabalhadores brasileiros têm ensino superior completo, conforme o Pnad. Por diferentes razões, muitos abandonam o curso antes de formarem. Soma-se a esse fato outro não menos alarmante: a péssima qualidade de boa parte – a maioria? – das faculdades, que despejam no mercado profissionais despreparados, como comprova, no caso dos cursos de Direito, a reprovação de cerca de 80% dos bacharéis que prestam o Exame da OAB com o intuito de exercerem a advocacia. “No Brasil, em vez de se buscar a universalização do ensino médio, como ocorre no mundo desenvolvido, o governo pensa em universalizar a entrada na universidade. A universidade não é para todos. Nos países em que se tem acesso à educação superior para mais de 80% da população jovem, mais da metade dos alunos está em cursos técnicos”, afirma Eunice Durham. E prossegue: “Há excelentes escolas de formação profissional fora das universidades. Com essa ideia de que todo mundo tem que prestar o Enem e entrar na universidade pública, persistiu-se no erro fundamental de que todo ensino técnico de segundo grau exige o ensino acadêmico primeiro. Na verdade, para se tornar um mecânico de automóveis, não é necessário aprender matemática avançada”.


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