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Revista da CAASP - Edição 20

SAÚDE \\ hoje recebemos denúncias de pessoas que, quando diagnosticadas com tuberculose, receberam retaliações, perseguições ou isolamento no trabalho. As pessoas acham que tuberculose é causada por vírus, que gripe mal tratada vira tuberculose, que pneumonia mal tratada vira tuberculose”, conta Basília. Ao comentar a meta proposta pela OMS de erradicar a tuberculose até 2035, Carlos Basília é enfático: “Se a gente não fizer um esforço coletivo, em pouco mais de uma década viveremos uma explosão de uma tuberculose mortal, tal qual ela já se manifesta em algumas populações. É por isso que até o mundo rico - Europa e Estados Unidos - classificou a tuberculose como emergência global”. Lacunas no tratamento Em 2012 foi lançado o primeiro medicamento contra tuberculose em mais de 50 anos - a bedaquilina -, o que representava uma oportunidade de aumentar a taxa de cura da tuberculose em sua forma multirresistente. Em 2014, um segundo medicamento - a delamanida - também foi aprovada para uso. Juntos, os dois novos remédios representam uma oportunidade sem precedentes no campo terapêutico. Os resultados do uso dessas duas drogas no tratamento da tuberculose multirresistente são animadores. Em dois meses de administração, o nível da infecção cai 54%. Com seis meses de tratamento, para 84%. “Até hoje, menos de mil pessoas em todo o mundo puderam ter acesso aos medicamentos, ou seja, apenas uma fração das 480 mil que desenvolveram tuberculose multirresistente em 2013”, afirma Felipe Carvalho, representante no Brasil da Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais da organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras. Há 30 anos a instituição combate a tuberculose oferecendo tratamento em situações de conflito crônico, como a vive o Sudão, e também a pacientes vulneráveis em contextos estáveis, como acontece no Uzbequistão e na Rússia. Os Médicos Sem Fronteiras constituem uma das principais vozes a gritar por mudanças urgentes e imediatas no diagnóstico e no tratamento da tuberculose multirresistente. Arquivo F. C. Carvalho: medicamentos não cobrem todos os doentes 28 // Revista da CAASP / Dezembro 2015 A principal barreira ao acesso a novos coquetéis contra a tuberculose é o preço. Essas drogas são particularmente caras. Para países em desenvolvimento, que concentram mais de 95% dos casos e mortes por tuberculoses no mundo, esse fator dificulta a regulamentação e a oferta dos remédios. A proteção por patentes contribui para os altos preços. Os laboratórios detêm o monopólio por até 20 anos, bloqueando a concorrência de versões genéricas mais baratas. Atualmente, o bedaquiline está registrado em agências regulamentadoras de 21 países. O delamanid, por sua vez, é regulamentado apenas para uso na Europa e no Japão. “A meta proposta pela OMS de acabar com a tuberculose até 2035 é necessária e válida, mas é importante que haja um compromisso à altura dessa ambição. Ao longo desses anos, nos deparamos com metas mundiais que não foram cumpridas nem pela metade”, lembra Carvalho. “Temos defendido a implementação de metas de curto prazo, quais sejam: redução das barreiras de patentes, oferta dos medicamentos a preços mais acessíveis e registro mais rápido dessas ferramentas nos países, além de inovações no campo da pesquisa”, enumera.


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