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Revista da CAASP - Edição 20

Dezembro 2015 / Revista da CAASP // 25 rotina em casa mudou muito. A esposa, com 50 anos de idade, começou a trabalhar numa empresa de pesquisa e descobriu a falta que faz uma faculdade. Matriculou-se no curso de pedagogia e já está no segundo ano, de olho em concurso na escola pública. João lembra que, na melhor fase da sua empresa, com a economia crescendo, ele comprava 1.000 quilos de resíduos plásticos de gráficas industriais. Eram as sobras de equipamentos como displays vendidos para o comércio. Como o movimento do comércio caiu, a encomenda de displays também foi reduzida. Para João, começou a faltar matéria-prima para reciclar. Aconteceu o mesmo com as sacolas plásticas usadas que comprava de cooperativas, para transformar em sacos de lixo. Nesse caso, porém, a causa foi o crescimento da atividade agrícola, um dos poucos setores da economia brasileira que mantiveram a expansão nos últimos anos. “Cresceu a indústria que fabrica mangueiras para irrigação, e essa indústria começou a comprar todo material para reciclagem disponível no mercado, pagando até um pouco mais. Quebrou os outros setores”, destaca João. No dia a dia, o empresário tomou conhecimento da dura realidade da saúde pública. Manteve a rotina de fazer exames de saúde, como o ultrassom da próstata, mas para realizar o procedimento teve que esperar seis meses e só conseguiu vaga num posto de saúde no Jardim Líder, perto de Itaquera, no extremo da Zona Leste de São Paulo, muito longe da sua casa. Diabético e com pressão alta, lutou para conseguir uma carteirinha do Instituto Dante Pazzanese, o que lhe dá alguma segurança no tratamento contínuo. O instituto é público, mas João se refere a ele como se não fosse mantido pelo SUS. Também procura a melhor escola pública para o filho, o que é muito difícil. Na primeira escola que matriculou o adolescente, notou a presença rotineira da Polícia Militar e viu que alguma coisa estava errada ali. Agora o filho está em outra escola, um pouco mais longe de casa, mas de melhor qualidade. “Fico tranquilo porque o menino só tira notas boas. Mas ele sentiu baque da mudança da escola particular para a pública. Uma vez ele me disse que queria ter mais aula de ciência na escola pública”, comenta. “Estou sempre ao lado e insisto para que também estude por conta própria, não dependa apenas da escola. Fico muito feliz porque ele me ouve”. João é um típico caso de quem perdeu muito, mas manteve a classe que realmente importa: a dignidade.


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