Page 22

Revista da CAASP - Edição 20

ESPECIAL \\ últimos anos, enquanto o país ainda crescia. Foi nessa hora que essa elite começou a gritar contra a inflação, mas quem passou a comer contra-filé não reclamou. A opção que está sendo feita agora é a de provocar novamente a redução dos salários, com um custo altíssimo para a população com empregos mais precários”. Quem acompanha a economia brasileira há pelo menos três décadas sabe que a palavra inflação aterroriza o brasileiro mais que qualquer outro termo econômico. E a inflação de hoje, alta, porém muito distante da hiperinflação dos anos 80/90, obedece a novos componentes. Ideologias à parte, ninguém mais elogia o corte de preços da energia elétrica efetuado no primeiro governo Dilma, medida que acabou resultando quase que um tarifaço neste segundo momento, empurrando a inflação para cima. Mas com a recessão já a perdurar por quatro trimestres, por que a inflação não cai? “A desvalorização cambial gera repasses muito fortes para os preços, seja porque ainda temos muitos insumos importados, seja porque temos contratos indexados, além de uma memória inflacionária bastante alta. Com isso, temos uma nova inflação, agora cambial”, avalia Laura Carvalho. Não se vence uma inflação de origem cambial promovendo queda de demanda pelo aumento do desemprego, assim entende a professora da USP. Desemprego como remédio contra a inflação? Professor da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, o economista Samuel Pessoa é o oposto econômico de Laura Carvalho. O ajuste que o governo tenta emplacar, e que a oposição no Congresso Nacional insiste em dificultar, segue, em tese, a cartilha pela qual Pessoa reza. Para o economista da FGV, a crise econômica tem potencial para reverter, em três anos, metade dos ganhos da chamada classe C. “O ajuste teria sucesso se fosse implementado em 2015. Quanto mais tempo demorar, maiores serão as perdas da classe C”, prevê. Paradoxalmente, Pessoa é um dos conselheiros econômicos do senador Aécio Neves, cujo partido, o PSDB, votou contra várias medidas do ajuste fiscal proposto pelo governo. Samuel Pessoa: “o rico tem recursos, por isso não corta consumo” 22 // Revista da CAASP / Dezembro 2015 Samuel Pessoa não acredita em enunciados aterrorizantes que vislumbram um país afundado em miséria. “Há exagero nesse tipo de afirmação. Desde a Constituição de 88, fomos lentamente e de forma persistente construindo um estado de bem-estar social, que tem inúmeros problemas, mas mesmo assim contém uma rede de proteção que ampara os mais pobres”, argumenta. De outra parte, diz que as pessoas foram enganadas pela política econômica dos governos Lula e Dilma. Ele cita o livro “Além da Euforia”, dos economistas Fábio Giambiagi e Armando Castelar, lançado em 2012, como um sinal de alerta sobre as inconsequências da economia brasileira que foi praticamente ignorado. “As pessoas gostam de ser enganadas. Houve um bom momento, mas junto com a situação boa veio a construção de desequilíbrios. Em economia é preciso ter medida, senso de proporção”. O remédio, para Samuel Pessoa, tem mesmo de ser amargo. E amargo para a classe média. “O rico tem recursos, e portanto não corta consumo. O ajuste é feito para que as pessoas justamente


Revista da CAASP - Edição 20
To see the actual publication please follow the link above