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Revista da CAASP - Edição 20

Mas o álcool também é devastador à saúde e causador de inúmeros incidentes e atos de violência. Sim, mas o álcool, do ponto de vista social, é aceito, no restaurante, na festa de casamento. Já a droga, não. Eu acho que o Supremo terá de pensar muito nisso antes de modificar aquele artigo que já estabelece uma solução adequada, no meu entendimento, para quem é dependente de droga. Vamos à Operação Lava a Jato. O senhor não acha que o juiz Sérgio Moro está exagerando um pouco em seus métodos? Essa tem sido uma critica generalizada, de certa forma, entre os criminalistas que atuam na defesa dos acusados. Eu atuo na causa como advogado da Petrobrás, como assistente do Ministério Público, porque no início do processo havia uma dúvida se as importâncias apreendidas deveriam reverter para a União ou para a Petrobrás. Nós entramos na causa e sustentamos que, de acordo com o Código Penal, o produto do crime deve reverter em primeiro lugar para a União se não houver vítima, mas havendo vítima deve reverter em favor da vítima ou do terceiro. Então, nossa posição foi demonstrar que Petrobrás, como instituição, como pessoa jurídica, era vítima desses golpes todos, e que, como vítima, ela tinha o direito de receber o volume das apreensões, o que está ocorrendo agora. Eu entendo que, na verdade, muitos casos podem ser tidos como abuso por não haver espontaneidade na delação, que deveria ser espontânea. Por outro lado, eu não posso deixar de considerar que se formou no nosso país um movimento típico de um golpe de Estado. Tradicionalmente, os golpes de Estado se caracterizam pela violência, pela violência das armas, por exemplo, quando se depõe quem está exercendo o poder. Mas há outros golpes de Estado em que não há violência, e vou lhe dar um exemplo: o golpe de Estado militar. Em 31 de março de 1964, o presidente de República, João Goulart, estava no Rio de Janeiro e foi para Brasília, de lá foi para o Rio Grande do Sul, e estava em Porto Alegre no dia 1º de abril quando o senador Auro de Moura Andrade declarou a vacância do cargo de presidente da República porque Jango estaria ausente do território nacional sem autorização. Este foi o golpe de 64. E qual o golpe de hoje? Quando dirigentes do Estado corrompem parte do Parlamento mediante pagamento de propina para votar em favor de projetos, pratica-se também um tipo de golpe de Estado. O que a Lava a Jato está fazendo, abstraindo o problema da legalidade ou não do meio de prova, é impedir a continuidade de um golpe de Estado conduzido pelo partido do governo. A delação tem aspectos positivos. Jamais descobririam os assassinos do embaixador chileno Orlando Letelier, que estava em Nova York quando Salvador Allende caiu com um golpe de Estado (1973), sem a delação. Ele era ligado a Allende e trabalhava contra o governo do general Pinochet. A Dina (Diretoria de Inteligência Nacional) foi o órgão que Pinochet usou para matar Letelier. Como se descobriu o crime? Foi ofertado a um dos participantes uma pena menor em troca de delação. Mas a delação requer investigação posterior, não? Evidente, e anterior também. Não é possível que com a delação se considere provado o delito. É preciso que haja provas circunstanciais, documentos etc. Se a delação tivesse valor absoluto, nós correríamos um sério risco, porque as investigações por este Brasil todo, feitas por delegados de polícia que não tivessem sensibilidade, utilizariam sempre a violência, a coação, para obter confissões dos crimes. Dezembro 2015 / Revista da CAASP // 15


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