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Revista da CAASP - Edição 20

EENNTTRREEVVIISSTTAA \\ Eu acho que a divisão maniqueísta entre esquerda e direita não existe mais hoje em dia, pois tal é o compromisso social que o indivíduo tem, e o compromisso individual com determinados direitos, que ora ele defende uma tese que era apanágio da esquerda, ora defende outra que era apanágio da direita. Então, eu entendo que essa rotulação é absolutamente indevida em nosso sistema de liberdades. Qual seria o perfil conservador, por exemplo? É nas escolas adotar o Hino Nacional no início de cada dia de aula? É hastear a bandeira? Por que isso é conservador? Por que conserva um símbolo do país, que é a bandeira? Não se deve atacar o civismo. Se fôssemos rotulá-lo, nosso Supremo Tribunal Federal seria conservador ou progressista? Eu acho que o STF tem uma composição de abertura do ponto de vista de liberdades fundamentais, que se apõe a determinados dogmas do conservadorismo. Ele tem inclusive linhas que, no meu entendimento, são muito abertas do ponto de vista de liberdades. Nós estamos vendo um debate que ainda não se exauriu quanto ao problema dos tóxicos. Há dois ou três vetos, um ministro considerando que se deve liberar de modo geral os tóxicos, outro ministro reduzindo essa liberação à maconha. Eu tenho uma opinião pessoal a respeito desse assunto. Durante muitos anos eu lutei contra a punição dos dependentes. Em 1968, quando vivíamos uma ditadura militar muito forte, houve uma lei que passou a punir com uma pena muito alta a posse mesmo para uso próprio, porque naquela época se dizia que movimentos de insurreição contra o regime militar eram orientados pela droga. Havia inclusive denúncias de que se plantavam entorpecentes em acusados, existia um movimento da repressão dizendo que aquela insurreição era estimulada pelos tóxicos, então surgiu essa mudança no Código Penal. Eu apresentei na Argentina um trabalho dizendo que não, que o dependente não pode ser sujeito à prisão, que o dependente é um problema de saúde. Mas isso evoluiu para a última reforma, a de 2006, em que não se estabelece a prisão para o dependente, e agora eu acho que há um equívoco: se nós falarmos no princípio da liberdade individual, que anima alguns votos, e da intimidade das pessoas, nós estamos justificando, por exemplo, uma receita contra a depressão – mas este é um lado da liberdade, para superar uma angústia pessoal. Há o outro lado, que é o estímulo para a prática da violência, do crime, e muitos crimes são praticados mediante o estímulo da droga, é evidente. A pessoa que pratica a violência à luz do dia, muitas vezes está denominada pela droga. O que eu vejo na liberação total é que não se pode considerar o problema da droga da mesma maneira que o problema da bebida alcoólica, ou da mesma maneira que o problema do cigarro, porque há limites nisso. Socialmente se admite o cigarro, a não ser em ambientes fechados, mas o fumo não é objeto de uma contestação social. A bebida alcoólica não produz o efeito que a droga produz, salvo nos casos de dependência. 14 // Revista da CAASP / Dezembro 2015 “A divisão maniqueísta entre esquerda e direita não existe mais”


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