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Revista da CAASP - Edição 19-

outros campos de atividade – da mídia, da política, do negócio. A história da humanidade é feita de grandes tragédias, de grandes perseguições, de grandes injustiças. O senhor acha que o que acontece atualmente com os refugiados na Europa pode ser classificado como uma das grandes tragédias da humanidade? Já é uma catástrofe histórica, e resulta de ações anteriores cujas consequências agora vêm à tona. Nós estamos vivendo apenas a primeira leva desse movimento migratório - haverá uma segunda mais adiante, quando não tivermos mais a utilização do combustível fóssil, afinal de contas as grandes massas que vivem no mundo árabe, especialmente, são produtoras de petrodólares e não têm estrutura de agricultura, de produção econômica, de produção industrial, porque elas vivem com o recurso do petróleo mantido por monarquias. Essas massas ficarão sem meio de subsistência no futuro, e eu não tenho dúvida de que elas tentarão subir em direção à Europa, onde há condição de vida, especialmente passando pela Turquia. Não é casual que o mundo turco hoje esteja tão atento. Seja por Istambul, seja por Constantinopla, seja por Bizâncio, a passagem sempre foi por ali. Esse tipo de catástrofe é quase criminosa. A catástrofe produzida pela natureza é uma intempérie, mas esta é algo que tem como dimensão o humano que abandona. E o brasileiro, ele é xenófobo? O Brasil foi um país de imigrantes, hoje não é mais. Boa parte daqueles que hoje aqui estão esqueceu que seus antecessores eram imigrantes. Hoje nós temos dificuldade em lidar com a imigração, nós acabamos fazendo o que fazia o antigo trapezista do circo: alguém segurava para ele uma escada, ele subia, e quando chegava no trapézio ele chutava a escada e ninguém subia mais. Em 1990, alguns vereadores paulistanos apresentaram projetos que vedavam a vinda de nordestinos e, o que é pior, que aqueles que aqui estivessem só pudessem ter acesso ao serviço público municipal se tivessem mais de cinco anos de residência aqui, como se houvesse dois tipos de brasileiros: os carimbados com a paulistanidade e os “intrusos” dentro da própria Nação. A gente captura essa ideia lembrando que uma das coisas mais difíceis de assimilar são os hinos nacionais. A ideia de humanidade é muito fraturada pelos hinos nacionais. Embora tenhamos nos hinos alguma beleza, boa parte deles é homicida, fala que o irmão de outro lugar precisa ser degolado, ser vazado por uma lança. A ideia dos hinos nacionais é sempre de luta, de combate. O nosso hino brasileiro é um pouco mais sutil ao dizer “que o filho teu não foge à luta” se necessário. Quando os europeus capturaram pessoas nascidas na África negra e as trouxeram para a América de modo a explorá-las, isso era chamado de expansão do mercado de produção. Quando esses mesmos grupos, como é o caso de haitianos, procuram voluntariamente deslocar-se para outro território, isso é considerado uma invasão. Nos livros didáticos, chama-se o avanço de Roma sobre outros povos de “expansão do Império”. Quando esses outros povos vão tomando de volta o que era deles, chama-se de “invasões bárbaras”. A diferença entre expansão e invasão está numa frase antiga: aprecia-se mais o chicote quando se está com o cabo na mão. A questão da imigração é humanitária e urgente, porque as pessoas não estão indo para outros lugares por divertimento. Elas o fazem impulsionadas pela necessidade óbvia de sobrevivência. Outubro 2015 / Revista da CAASP // 11


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