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Revista da CAASP -Edição 18-

\\ Prova da universal difusão da obra de Voltaire e sua popularidade é um filme rodado em 1954 no Brasil, a comédia da Vera Cruz, “Candinho”, em que Mazzaroppi repetia, a propósito de qualquer coisa, que “tudo é pra miorá a vida da gente”, doutrina que aprendera com o professor Pancrácio na fazenda onde morava e de onde fora expulso. Leibniz já havia morrido há mais de quatro décadas quando Voltaire escreveu Cândido. Os motivos que o levaram a escrever a pequena obra-prima envolvem notadamente o clero francês e seu dileto adversário Jean Jacques Rousseau. Em 1755, no dia de Todos os Santos, um terremoto de grandes proporções atingiu Lisboa, matando 30 mil pessoas. Uma das razões de tão grande número de mortes foi exatamente o fato de as igrejas estarem repletas de gente devido ao dia santo. Reprodução Mais uma vez valho-me de Will Durant para relatar o que se seguiu: o clero francês pôs-se a pregar explicando a catástrofe como punição dos céus aos pecados do povo lisboeta. Impressionado com a tragédia e irritado com os religiosos, Mazzaropi, o Cândido brasileiro Voltaire escreve um longo poema, denominado: Poema sobre o Desastre de Lisboa ou Exame deste Axioma: Tudo Está Bem. Nele, refutando a conciliação da existência do mal com a figura de um Deus onipresente e infinitamente bom, realçou o antigo dilema: ou Deus podia evitar o mal e não o quis, ou quis evitá-lo e não o pode. Poucos meses depois rebentou a guerra dos Sete Anos. Voltaire julgava uma loucura que a Europa se dilacerasse por conta de uma disputa entre a Inglaterra e a França para determinar a quem pertenceriam “umas poucas geiras de neve” no Canadá. No auge da guerra, vem a público uma carta de Rousseau em resposta ao poema de Voltaire sobre Lisboa. Ele dizia que era a si mesmo que o homem deveria culpar pelo desastre, argumentando que se vivêssemos nos campos e não nas cidades, não teria sido tão grande o número de mortos; se vivêssemos ao ar livre e não em casas, as casas não desabariam sobre nós. 36 // Revista da CAASP / Agosto 2015 Voltaire ficou enraivecido, não só pela crítica a seu poema, porém tanto mais pelo fato de Rousseau utilizar-se dele para propagandear o selvagismo, ridicularizado por ele, Voltaire, desde a publicação do Discurso sobre a Origem da Desigualdade. Na ocasião, tendo Rousseau lhe enviado o livro, recebeu a seguinte resposta, com o inconfundível sarcasmo: “Recebi, senhor, seu novo livro contra a espécie humana e sou-lhe grato pela remessa... Jamais alguém se esforçou tão inteligentemente para transformar-nos em animais; a leitura de seu livro dá-nos vontade de WEB


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