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Revista da CAASP - - - - Edição 08

\\ Vários aspectos jurídicos são discutidos. Talvez um dos mais interessantes seja aquele em que Arendt analisa os conceitos de genocídio e crimes contra a humanidade, indicando sua tipificação a partir da Segunda Guerra. Embora massacres populacionais tenham ocorrido desde a antiguidade, por sua natureza os crimes praticados pelos nazistas foram considerados inéditos do ponto de vista formal, e assim eles foram julgados a partir de legislação posterior com força retroativa. Em Nuremberg, ao final da Segunda Guerra, os nazistas acusados como criminosos foram julgados com base na Carta (Acordo) de Londres, de 1945, pela qual os aliados estabeleceram o Tribunal Militar Internacional em Nuremberg. A autora endossa a retroatividade da lei em casos desta natureza, argumentando que a “retroatividade ... viola apenas formalmente, não substancialmente, o princípio nullum crimen, nulla poena sine lege, uma vez que este se aplica significativamente apenas a atos conhecidos pelo legislador; se um crime antes desconhecido, como o genocídio, repentinamente aparece, a própria justiça exige julgamento segundo uma nova lei”. Em Jerusalém, a partir de legislação israelense de efeito igualmente retroativo, Eichmann foi julgado sob a Lei (Punitiva) dos Nazistas e Colaboradores dos Nazistas, de 1950, tendo como precedente outros julgamentos do pós-guerra ocorridos em tribunais nacionais europeus visando à punição de criminosos nazistas. Esses tribunais, assim como a Corte Distrital de Jerusalém, tiveram por precedente os julgamentos de Nuremberg. Naturalmente, Hannah Arendt não deixa de discutir o fato de Israel ter raptado Eichmann na Argentina, como o episódio foi contornado diplomaticamente e outras circunstâncias políticas internacionais que propiciaram o julgamento em Jerusalém. No entanto, ela defendia a ideia de que crimes contra a humanidade deveriam ser julgados por um Tribunal Internacional permanente, desta forma criticando não apenas a Corte Distrital de Jerusalém e outros tribunais nacionais do pós-guerra, quanto o Tribunal Militar Internacional de Nuremberg, todos eles em sua opinião sendo, na prática, “cortes dos vencedores”, razão que ela apresenta para não terem sido igualmente julgados crimes que atribui aos aliados, em especial aos americanos no Japão e aos russos na Polônia. No julgamento de Eichmann, sendo evidentes os argumentos da acusação, quais os da defesa? O réu a todo tempo alegou que agia em cumprimento do “dever”, de “obediência a ordens”; seu advogado preferiu tentar demonstrar a insustentável tese de que suas ações correspondiam a “atos de estado”. 46 // Revista da CAASP / Dezembro 2013


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