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Revista da CAASP - - - - Edição 08

mudam mais, mas a história continua mudando o tempo todo, pela forma como nós olhamos o passado. Essa narrativa e essa interpretação são produtos das circunstâncias do futuro, e não do passado. A forma como a República se consolidou no Brasil - uma República militar, uma ditadura já com o marechal Deodoro da Fonseca, que fechou o Congresso – promove uma história épica militar. Naquela época, havia três candidatos possíveis a “pais” da República: Quintino Bocaiúva, que era civil, intelectual do Rio de Janeiro, jornalista; Benjamin Constant, professor da Escola Militar, formador e “fermento” da chamada Mocidade Militar; e o marechal Deodoro da Fonseca, oficial veterano da Guerra do Paraguai, que era o único que tinha autoridade moral... Dezembro 2013 / Revista da CAASP // 17 E que nem era republicano! Era monarquista, mas se impôs e na narrativa futura foi descrito como o proclamador da República. Então, é inevitável que a história cometa injustiças com seus personagens, às vezes “inflacionando” um e desvalorizando outro. A história não é uma ciência exata, não existem fatos e personagens absolutos e incontestáveis – por isso eu entrei nessa discussão das biografias. Autorizar somente biografias “chapa branca” é engessar a história, é tirar sua diversidade, que é justamente o que faz seu encanto. Por que a atuação de Ruy Barbosa como ministro da Fazenda não destruiu sua imagem pública? Há dois Ruy Barbosa na história. Um é o Ruy Barbosa da Campanha Civilista, que é grandioso, realmente um homem que defende os direitos fundamentais, um grande intelectual. Outro é o jovem Ruy Barbosa, o da Proclamação da República e do Governo Provisório. Um tem pouco a ver com outro. O Ruy Barbosa da Campanha Civilista é um homem maduro, com muita experiência. O outro é um republicano tardio: até pouco tempo antes do 15 de Novembro ele era monarquista federalista, assim como Joaquim Nabuco, e era mais federalista que republicano. Então ele percebe que a monarquia jamais faria uma reforma federalista e adere ao movimento republicano – e se torna um incendiário. Os artigos dele na imprensa do Rio de Janeiro são uma coisa terrível, ele insufla o Exército contra o Império, bate pesado no imperador. Ele é a pena mais incendiária que existe naquele momento. Depois, vem o Ruy Barbosa ministro da Fazenda, que faz uma besteira – uma reforma bancária desastrosa -, promove o “encilhamento”. Mas é engraçado porque, nessa construção do imaginário republicano futuro, essa participação dele na história ficou na sombra. O que prevaleceu, para a sorte dele, é a imagem de Águia de Haia e a do homem da Campanha Civilista, o jurista.


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