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Revista da CAASP - - - - Edição 08

EENNTTRREEVVIISSTTAA \\ Eu acho que ele viveu eternamente desconfortável com esse papel. Isso se observa nas cartas dele à condessa de Barral, em que ele dizia preferir ser um presidente da República, e não um imperador. Nas viagens ao exterior, ele gostava de ser chamado simplesmente de Pedro de Alcântara, carregava a própria maleta. Você vê que ele não se sentia confortável com seu papel institucional, havia um descolamento entre o ser humano e a instituição de Estado que representava. Isso me encanta, mas também me compadece. O marechal Floriano Peixoto, segundo presidente da República, foi mesmo um dos maiores tiranos da História do Brasil? É interessante observar o papel de Floriano, porque ele foi o salvador da Pátria, um mito muito recorrente na História do Brasil. Éramos um país que herdara uma geleia social do período colonial – analfabetos, pobres e escravos –, muito complexo, com muitas realidades regionais, geográficas e culturais, um país sempre à espera de um messias, um salvador da Pátria que viesse e botasse ordem na casa. A história brasileira é permeada por salvadores da Pátria, mas Floriano é o exemplo supremo disso, e é um enigma. É um homem que consolida a República a ferro e fogo. Ele tinha um aspecto assustador. Os cronistas da época – Ruy Barbosa, Euclides da Cunha – frequentemente comparam Floriano Peixoto ou a um animal peçonhento ou a um batráquio, que são os animais mais traiçoeiros da flora. Havia suspeita de que ele fosse alcoólatra às escondidas. Mas ele age determinado, enfrenta a Revolta da Armada, a Revolução Federalista no Sul, manda fuzilar 180 pessoas em Florianópolis, então Vila do Desterro, numa única noite. Ele representa o neopositivista de uma República que precisava ser tutelada. A ideia positivista, de Auguste Comte, permeia toda a história republicana brasileira. Getúlio Vargas, no Estado Novo, é um discípulo de Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros, que eram positivistas. Os generais-presidentes de 1964, dois deles gaúchos, eram positivistas, e o meio militar é muito seduzido por isso até hoje. Os chamados “vultos da Pátria”, como os estudamos na escola, nem sempre são pessoas que mereceriam esse título, enquanto outros, que mereceram de verdade, às vezes nem constam dos livros escolares. Por exemplo, Benjamin Constant, talvez a figura mais decisiva da Proclamação da República, aparece sumariamente nos livros do ensino médio, quando aparece. Por quê? Silva Jardim muito menos, e ele foi o grande propagandista do regime republicano, tendo percorrido o Brasil inteiro . Ele era advogado. Isso é uma coisa que me encanta e também me incomoda: não existe uma verdade histórica absoluta. Os personagens e acontecimentos do passado são reais, não 16 // Revista da CAASP / Dezembro 2013


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