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Revista da CAASP - Edição 27---

focados nas pessoas do que num prédio de não sei quantos andares, departamentos etc. Você teria o mesmo prazer em escrever se soubesse que seu livro não seria impresso em papel? O prazer depende mais de quais e quantas pessoas leem o livro do que o meio em que ele está. Nós dois somos de uma geração que se identifica com o papel, mas a minha opinião e a sua não têm a mínima importância para as novas gerações. As pessoas mais jovens podem ler em papel com um certo fetiche, assim como ouvem discos em vinil, mas certamente no futuro a leitura em papel não será na mesma escala que é hoje. Mas muitos hábitos tidos como extintos acabam voltando. Eles voltam quando têm algo a oferecer que a tecnologia nova não tem. Eu acho que o livro até tem algo a oferecer que o mundo virtual não tem, mas seu custo talvez não compense. O disco em vinil – é curioso – , as pessoas estão pagando muito mais por ele, mas o som do vinil é de fato diferente do som do disco eletrônico. Basicamente, o que acontece é que quem compra vinil é uma minoria. Em termos de massa, as coisas evoluem em favor da tecnologia. Eu acho que o livro em papel vai sobreviver em nichos, claro, só não sei se vai ter escala industrial para sustentar a indústria como hoje. Você é formado em Direito, e advogou. Em algum momento viu-se exercendo o Direito pelo resto da vida? Em algum momento da faculdade, sim. Eu gostava de estudar algumas matérias, mas da vida prática de advogado eu nunca gostei. Eu trabalhei em escritório de advocacia por um ano. Eu acho que teria continuado como advogado se não tivesse recebido um convite para vir para São Paulo trabalhar como jornalista. Mas meu plano já era – eu estudei jornalismo – ficar meio turno no escritório e escrever crônicas para jornal, aquela coisa do homem de letras antigo. De qualquer modo, acho que as coisas se tornaram muito especializadas, cargas horárias... Em que grau seus livros são autobiográficos? Depende, dá para responder de muitas formas. Se você pensar que autobiografia são coisas que aconteceram na sua vida e você lembrou, a resposta é: cada vez menos. Eu escrevi muito sobre infância e adolescência, acho que isso esgotou, eu não tenho tantas histórias, ninguém tem. Em “O tribunal da quinta-feira” não há nenhuma história que tenha acontecido comigo de verdade. Mas é curioso: a casa do personagem, por exemplo, é um pouco a casa da minha infância. De qualquer modo, está muito mais para invenção do que para autobiografia. Como é exercer a profissão de escritor, a rotina de produzir, tratar com editores, cumprir prazos, receber honorários? Eu imaginava trabalhar como escritor sem abandonar meus outros empregos. Se hoje eu consigo minimamente me manter... eu tenho uma vida relativamente barata. Eu trabalhei muito tempo na imprensa, depois em institutos culturais, e ganhei, em 15 anos, dinheiro REVISTA DA CAASP 17 ENTREVISTA | MICHEL LAUB A IRONIA É UM RECURSO ESPETACULAR DA LÍNGUA, QUE DIFERENCIA OS HOMENS DOS ANIMAIS


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