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Revista da CAASP - Edição 24

da arte mundial. Na teoria econômica isso é absurdo, porque uma empresa que usa tecnologia do estado da arte mundial tem que ser competitiva, ponto. O mercado é para garantir isso. Só que o mercado, rigorosamente, não garante isso, e um dos motivos principais nas relações internacionais é a Doença Holandesa. No caso do Brasil, onde a Doença Holandesa não é muito grave - é uma Doença Holandesa de 20%, vamos chamar assim, um pouco arbitrariamente -, se você não a neutraliza você fica com uma apreciação de 20%. Em termos bem objetivos, vamos supor que a taxa de câmbio que torna competitivas as empresas industriais que usam tecnologia no estado da arte mundial seja 3 reais por dólar. A diferença entre 3 e 3,80 é a Doença Holandesa. Ela aumenta ou diminui de acordo com as variações do preço internacional das commodities e também com variações no custo unitário do trabalho, ou seja, dos salários e da produtividade. Então, o Brasil tem essa Doença Holandesa, que custa uns 20%, que implica uma desvantagem competitiva para as empresas industriais, e no entanto o Brasil se industrializou de forma extraordinária entre 1930 e 1980! Como isso foi possível? Foi possível porque o Brasil, nesse período, neutralizava a sua Doença Holandesa através de alguns mecanismos. Em vários momentos você tinha taxas múltiplas de câmbio - uma taxa de câmbio para a indústria e outra taxa de câmbio para a agricultura, por exemplo. E isso seria viável hoje? Hoje, não. Hoje, os acordos internacionais impedem isso. Outro sistema, que prevaleceu no Brasil entre 1967 e 1990, foi o que eu chamo de “mecanismo Delfim Netto”, porque foi o Delfim que o levou adiante, quando foi ministro da Fazenda a partir de 67. Era um sistema de tarifas alfandegárias muito altas - 45% - e um sistema de subsídios só para a indústria exportar, outra vez de 45%. Isso neutralizava a Doença Holandesa. O Brasil precisa disso de novo? O Brasil precisa disso, mas espere. Esse sistema foi terminado em 1990, em nome de uma abertura comercial que eu ajudei a fazer. Eu fui o primeiro ministro da Fazenda que adotou como política a abertura da economia. Eu dizia para mim mesmo e para a sociedade que não fazia sentido, pois o Brasil não possuía mais uma indústria infante, que precisava ser protegida. Nós tínhamos uma indústria já madura, que seria competitiva internacionalmente. Só que eu não sabia da Doença Holandesa, e não sabia que naquele mecanismo dos 45% não era tudo proteção: boa parte disso era neutralização da Doença Holandesa. Em 1990, então, as empresas industriais passaram a ter em média uma desvantagem competitiva de 20%. REVISTA DA CAASP 15 ENTREVISTA | LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA


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