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Revista da CAASP - Edição 22---

ESPECIAL \\ Um perigoso ato contra a cidadania O Supremo Tribunal Federal, que nos últimos tempos vinha sendo responsável por uma série de avanços no sentido da democracia plena, volveu-se na direção oposta. Talvez o clamor popular pela punição dos corruptos que infestam a cena política e empresarial configure, neste caso, uma má influência, a despeito de os magistrados jamais assumirem sua suscetibilidade à voz das ruas, aquela que 12 // Revista da CAASP / Abril 2016 confunde justiça com justiçamento. Reportagem de Paulo Henrique Arantes* Por sete votos a quatro, o plenário do STF negou o habeas corpus 126.292 no último dia 17 de fevereiro, uma quarta-feira negra para a democracia, permitindo a execução de pena condenatória após a confirmação de sentença em segundo grau – antes do trânsito em julgado, portanto. Na prática, o que a corte fez foi acabar com a presunção de inocência, violando frontalmente o Artigo 5º (Inciso LVII) da Constituição Federal. Detalhe: a medida contradiz entendimento do próprio Supremo, de 2009, quando do julgamento do habeas corpus 84.078. O relator, ministro Teori Zavascki, foi acompanhado pelos colegas Luiz Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, José Antonio Dias Toffoli, Carmem Lúcia e Gilmar Mendes. Foram vencidos os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Em seu voto, Zavascki afirmou que se deve presumir a inocência do réu até que seja prolatada e confirmada a sentença penal em segundo grau, exaurindo-se, a partir desse momento, o princípio da não-culpabilidade, porque os recursos cabíveis da decisão de segundo grau, tanto ao Superior Tribunal de Justiça quanto ao Supremo Tribunal Federal, não se prestariam a discutir fatos e provas, apenas matéria de Direito. “Ressalvada a estreita via da revisão criminal, é no âmbito das instâncias ordinárias que se exaure a possibilidade de exame dos fatos e das provas, e, sob esse aspecto, a própria fixação da responsabilidade criminal do acusado”, defendeu o ministro. Tecnicalidades à parte, o voto de Teori Zavascki desprezou, além da Constituição brasileira, princípios contidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, como apontado no voto contrário do ministro Celso de Mello: “A presunção de inocência, legitimada pela ideia democrática – não obstante golpes desferidos por mentes autoritárias ou por regimes autocráticos que absurdamente preconizam o primado da ideia de que todos são culpados até prova em contrário –, tem prevalecido, ao longo de seu virtuoso itinerário histórico, no contexto das sociedades civilizadas, como valor fundamental e exigência básica de respeito à dignidade da pessoa humana”. O decano foi além: “A repulsa à presunção de inocência – com todas as consequências e limitações jurídicas ao poder estatal que dessa prerrogativa básica emanam – mergulha suas raízes em uma visão incompatível com os padrões ortodoxos do regime democrático, impondo, indevidamente, à STF Celso de Mello: voto contundente em defesa dos direitos humanos STF


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