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Revista da CAASP -Edição 17

O Brasil é o campeão mundial de cesarianas, uma marca que nos cobre de vergonha”, diz a professora Sônia Hotimsky, professora de Antropologia da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e autora de um estudo sobre a formação médica em obstetrícia. “São várias causas, mas a principal é o modelo de assistência no parto, em que o médico é a figura central”, acrescenta. A professora Sônia lembra que o parto é uma decorrência natural da gravidez, que obedece à fisiologia da mulher. Mas, para o médico com formação intervencionista a cesariana acaba se tornando o caminho mais prático – e mais rápido – para trazer à luz uma nova vida. É óbvio que não se trata de condenar o procedimento cirúrgico quando o parto normal, por algum problema, traz risco à vida da mãe e à da criança. O presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), Etelvino Trindade, concorda com a avaliação de que o perfil profissional do médico contribui para a existência de um quadro com elevado número de cesarianas, mas responsabiliza o governo por essa distorção. É que, no início dos anos 1970, passou-se a exigir a presença do médico durante o parto como condição para o profissional receber honorários. “A partir daquela época, por uma diretriz do INSS, para receber, o médico deveria estar presente durante o parto. A partir desse momento, o médico obstetra passou a fazer os partos e estruturamos uma cultura ‘medicocêntrica’ para o nascimento. Desapareceram as equipes profissionais e os nascimentos passaram a ser feitos no hospital. No entanto, até hoje, não há médicos o bastante para tantos nascimentos. Por isso, é comum que ele faça um parto atrás do outro”, afirma Trindade, para quem a mulher também contribuiu para o surgimento dos que alguns chamam de epidemia de cesarianas. “Ela passou a optar pela cesariana, por entender que o procedimento num centro cirúrgico é mais seguro e também para evitar a dor do parto”, diz. Foi esse o caso da advogada Ana Maria Lanatovitz, que é coordenadora de eventos da Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP e integrante do Conselho Estadual da Condição Feminina. Ela teve dois filhos, o mais velho hoje tem 36 anos e a mais nova, 34. “Eu tinha 19 anos no nascimento do meu primeiro filho e optei pela cesariana. No nascimento da minha filha, eu tinha 21 e quis cesariana de novo, mas depois fiz plástica, para eliminar a cicatriz”, conta. Ana Maria concorda que o número de cesarianas é elevado no Brasil, e defende campanhas para valorizar o parto normal. Mas, no seu caso, diz que não se arrepende de optar pelo procedimento cirúrgico. “Eu realmente tinha medo da dor”, afirma. Sobre partos, a professora Sônia conhece o lado teórico, como pesquisadora, e o lado prático, como mãe de dois filhos. Ela também sabe – porque sentiu na pele – a diferença entre o parto normal e a intervenção cirúrgica. Nina, a primogênita, nasceu de cesariana. Marcelo, o segundo, veio ao mundo pelo método natural. “O nascimento do Marcelo foi muito menos traumático”, lembra. Arquivo A. M. L. Junho 2015 / Revista da CAASP // 25 Arquivo S. H. Ana Maria: “optei pela cesariana por medo da dor” Sônia: críticas ao modelo de assistência ao parto


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