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Revista da CAASP - Edição 11 --

O ministro Celso de Mello, ao analisar o princípio da proporcionalidade no âmbito da atividade legislativa, anotou, com a acuidade que lhe é peculiar, que “a elaboração da norma penal incriminadora não pode subtrair-se à obediência aos preceitos constitucionais. Cumpria, pois, à Lei no 9.426/96, ter como parâmetro o princípio da proporcionalidade entre o fato cometido e a gravidade da resposta penal, pois é nesse momento, o da individualização legislativa da pena (CF, art. 5o, XLVI), que a proporcionalidade apresenta fundamentalmente a sua eficácia” (STF, Medida Cautelar no HC no 92.525/RJ, DJ 4. 4. 2008). Atualmente, há Projeto de Lei em trâmite na Câmara dos Deputados (PL 4898/12) que busca corrigir o equívoco normativo, reduzindo significativamente as penas mínimas previstas e retirando expressões que ampliam indevidamente o tipo penal. O Projeto do novo Código Penal (PLS 236/12) propõe alteração semelhante para referida norma incriminadora. Todavia, enquanto o legislador não observar o princípio constitucional da proporcionalidade, caberá ao magistrado realizar os ajustes necessários a fim de compatibilizar a resposta estatal com a gravidade da conduta. Para tanto, há permissivo legal: o artigo 5o da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (Lei no 12.376/10) estabelece que o julgador deve interpretar a lei, buscando, sempre, o fim precípuo de sua atividade, que é a aplicação da justiça. A analogia – método hermenêutico que visa suprimir eventual omissão legislativa – quando utilizada em benefício do réu, surge como ferramenta legítima para combater os desacertos legislativos. Como anota Francisco de Assis Toledo1, a utilização da analogia para adequar situação desproporcional e injusta, ainda que não exista efetiva lacuna legislativa, é possível, pois “encontra justificativa em um princípio de equidade”. Obedecendo a essa ordem de ideias, há diversas decisões desclassificando imputações capituladas no artigo 273 do Código Penal, mediante analogia in bonam partem, para aplicar a punição prevista ao tráfico de drogas, inclusive com a incidência, quando cabível, do redutor do artigo 33, § 4o, da Lei no 11.343/062 – embora muitos magistrados ainda insistam em manter a desproporcional reprimenda prevista na lei, mesmo quando inegavelmente injusta. Tales Castelo Branco é advogado criminal. Foi presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo e vice-presidente do Conselho Federal da OAB. É membro da Comissão da Verdade da OAB-SP. 1) A título de exemplo, veja-se que as penas mínimas cominadas aos crimes de roubo (ar t. 157, caput, do Código Penal: 4 anos de reclusão); homicídio simples (ar t. 121 do Código Penal: 6 anos de reclusão); estupro de vulnerável (ar t. 217-A do Código Penal: 8 anos de reclusão) e tor tura qualificada pelo resultado mor te (ar t. 1o, § 3o, da Lei no 9.455/97: 8 anos de reclusão) são inferiores à pena cominada ao crime do ar tigo 273 do Código Penal.70.10.0003 72-3/ PR. 2) Princípios Básicos de Direito Penal, 5a ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p. 27. 3) STJ: REsp no 915.442/SC; TJ/SP: Apelações nos 0050385-84.2009.8.26.0050, 0005283-55.2009.8.26.0562; 993.05.038043-2; TJ/SC: Apelações nos 2012.001674-9, 2011.004375-0, 2008.040138-5, 2006.004732-9; TJ/ PR: Apelações nos 649.611-3, 530.933-3, 794.724-2, 849.173-2, 1.068.532-8; TJ/RS: Apelações nos 70049650203, 70042137349, 70056784333, Embargos Infringentes no 70047523469; TRF1: Apelação no 0006218- 03.2010.4.01.3307/BA; TRF2: Apelação no 2003.51.01.503442-1/RJ; TRF3: Apelações nos 0000488-38.2007.4.03.6127/ SP, 0002736-35.2010.4.03.6106/SP; TRF4: Apelações nos 2001.72.00.003683-2/SC, 0002348-15.2005.404.7001/ PR, 2006.70.05.004797-1/PR, 2006.70.02.0101 67-7/PR, 2006.70.02.005860-7/PR, 0009441-55.2007.404.7002/ PR, 0006405-68.2008.404.7002/PR, 0000181-90.2008.404.7010/ PR, 00058268620094047002/PR, Embargos Infringentes no 2008. 70.10.0003 72-3/PR. Junho 2014 / Revista da CAASP // 57


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