Page 59

Revista da CAASP - - - - Edição 08

A OEA (Organização dos Estados Americanos), em 2006, reconheceu “o direito que assiste às vítimas de violações manifestas aos direitos humanos e violações graves ao direito internacional humanitário, assim como às suas famílias e à sociedade, em seu conjunto, de conhecer a verdade sobre tais violações da maneira mais completa possível, em particular a identidade dos autores e as causas, os fatos e as circunstâncias em que se produziram”. Tratando da função da memória, Todorov adverte que os regimes totalitários do século XX revelaram a existência de um perigo antes insuspeitado: a supressão da memória. Entre nós, as Forças Armadas vêm sustentando, principalmente com base na Lei de Microfilmes (nº 5.477/68) e no Decreto n.79.099/77, que os documentos do período militar foram incinerados. Difícil de acreditar quando se sabe que o estamento militar guarda até hoje documentos sobre a Guerra do Paraguai. Ademais, as normas citadas obrigam à conservação dos documentos de valor histórico. Em casos de documentos a serem destruídos, há previsão do registro da destruição, o que também não existe. Fato é que militares conservaram muito do que poderia ter sido destruído, ainda que ilegalmente. Esses “baús” volta e meia são noticiados pela imprensa como tendo sido entregues ou vendidos aqui e ali. O Estado, por meio de seus órgãos jurídicos próprios, deve buscar essas fontes, para que possamos recuperar um dos acessos à verdade que ali pode ter o fio da meada. A OAB-SP e sua Comissão da Verdade já convocaram os advogados a colaborarem com a memória da advocacia nos anos da ditadura, não só na defesa dos presos políticos, como na assessoria a trabalhadores perseguidos e na promoção das prerrogativas profissionais. Já tomou depoimentos, e corre o Estado de São Paulo em busca das histórias de dignidade vividas pelos advogados. E, juntamente com outros parceiros, retomou o antigo prédio da Justiça Militar, para ali instalar o Memorial pela Luta da Justiça. É possível que a criação da Comissão Nacional da Verdade, com a explosão de formação de inúmeras outras comissões, possa levar a informações que supram a lacuna que a falta de vontade política das Forças Armadas gerou. E, ainda, sensibilize militares que nada tiveram a ver com tortura e sua defesa (ou ocultamento) a descobrir em algum porão ou sótão recôndito as informações que completem a história e atendam à exigência da sociedade pelo conhecimento da verdade. Belisário dos Santos Jr. é advogado, vice-presidente da Comissão da Verdade da OAB-SP, membro da Comissão Internacional de Juristas e da Comissão Especial para Mortos e Desaparecidos Políticos do Estado Brasileiro. Foi secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo (1995-2000). Dezembro 2013 / Revista da CAASP // 59


Revista da CAASP - - - - Edição 08
To see the actual publication please follow the link above