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Revista da CAASP -- Edição 07--

OPINIÃO \\ Maioridade penal, modernidade e racismo Dentre os argumentos dos defensores da diminuição da maioridade penal, um se destaca pelo grau de falsidade ou desinformação: a falácia segundo a qual no Brasil contemporâneo os adolescentes já teriam desenvolvido suficiente autonomia moral e capacidade de discernimento, porquanto estariam plenamente preparados para a responsabilização criminal. A suposta “modernização” da lei seria mera consequência da “modernização” da sociedade. A tese da adaptação da lei a necessidades modernas não resiste, entretanto, à mais desatenta observação da história do Direito Penal brasileiro. O Direito Penal lança raízes no Brasil em 1603, com o Livro V das Ordenações Filipinas, cujo Título 135 fixava a idade de 17 anos para a imputabilidade penal. Proclamada a Independência e promulgada a primeira Constituição brasileira, entra em vigor o Código Criminal do Império, em 1830, que reduziu o limite de idade para 14 anos. Já o Código Penal republicano, de 1890, adotado dois anos depois da abolição do escravismo e um ano antes da primeira Constituição da República, autorizava a responsabilização criminal a partir dos 9 anos: “art. 27. Não são criminosos: § 1º. Os menores de 9 annos completos; § 2º. Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento”. Assim é que durante quatro décadas vigeu no Brasil a regra da imputabilidade penal aos 9 anos, revogada apenas com a aprovação da Consolidação das Leis Penais, em 1932, que elevou o limite mínimo para 14 anos. Com a reforma penal empreendida pelo Estado Novo, foi aprovado o Código de 1940, em vigor, fixando a capacidade penal aos 18 anos, norma esta alçada ao nível constitucional, conforme disposto no art. 228 da Constituição de 1988. Temos assim que redução da idade penal nada tem de novidade, constituindo, na essência, um velho critério de política criminal que mal disfarça a incúria do Estado em face dos problemas estruturais de educação e integração social e econômica da juventude brasileira. Ademais, admitindo-se o duvidoso raciocínio da constante “evolução da sociedade”, não tardará o dia em que, em nome do combate à criminalidade, o Congresso Nacional termine aprovando uma lei determinando a 56 // Revista da CAASP / Outubro 2013 por Hédio Silva Júnior* Ricardo Bastos


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