
seios em seu corpo, como os de uma mulher.
Para retirá-los, precisou passar por uma
cirurgia que custou 7 mil reais. Ele deu
cheques pré-datados e, cinco dias depois da
operação, ainda com pontos, ele já estava de
volta ao volante, para poder juntar dinheiro
e fazer o depósito.“Eu ganho mais como
Uber, mas tenho sempre que correr atrás”,
comenta.
Motoristas do Uber não têm mais um
patrão físico, mas continuam subordinados.
E quem dá ordens a eles é um programa
do computador, como lembra o motorista
Wilson. Eles trabalham agora para uma
máquina.
“Se eu recusar cinco corridas por pool,
o sistema detecta e eu posso ficar fora da
plataforma”, conta. Seu trabalho também é
permanentemente avaliado, como se tivesse
um supervisor. E quem faz essa avaliação é
o cliente, que involuntariamente assumiu o
papel de verificador do trabalho alheio.
Dependendo do número de estrelinhas que
receber, o motorista poderá ser disciplinado
pelo algoritmo, que é o código secreto de
qualquer programa, o
qual define, por exemplo,
quem deve ficar com a
melhor ou com a pior
corrida.
Quando começa a
receber corridas pingadas,
o motorista sabe que o
sistema o está punindo.
Já quando as corridas
são de longa distância,
para aeroportos, por
exemplo, tem certeza de
que está bem na fita com
o algoritmo.
Certa vez, Wilson
tentou questionar uma
punição que recebeu —
REVISTA DA CAASP 49
Pixabay
o desconto de uma corrida cujo percurso
foi contestado pela cliente. “Você não fala
com ninguém, só através do chat. Eu estava
argumentando no chat que o percurso tinha
sido definido pelo aplicativo Waze. À certa
altura, quem estava do outro lado do chat
respondeu que, se eu continuasse com a
minha reclamação, eu seria excluído da
plataforma”, disse.
“Fiquei com vontade de mandar a pessoa
que estava do outro do chat para aquele lugar,
mas fiquei quieto, engoli, porque eu preciso
do aplicativo para trabalhar”, acrescentou.
A professora Ludmila Costhek Abílio,
pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais
e de Economia do Trabalho da Unicamp,
observa que o fenômeno da uberização do
trabalho está longe de se restringir ao setor
de mobilidade urbana ou de transporte. “Já
se fala em capitalismo de plataforma, que se
organiza pelas plataformas”, diz ela, autora de
estudos sobre essa nova forma de trabalho.
Em entrevista à Revista da CAASP,
Ludmila diz que é preciso ter em mente
que a “uberização” não é apenas fruto do
desenvolvimento tecnológico. “Na verdade,
a uberização, com os motoristas do Uber,
deu visibilidade a elementos que estão em
curso no mundo do trabalho desde o final da
década de 70, início da década de 80, quando
direitos trabalhistas começaram a ser vistos
DIA A DIA