Então, você tinha uma política
externa que era menos uma
política de Estado, como
tradicionalmente caracteriza o
Brasil, e mais uma política que
combinava uma política de Estado
com uma política de governo, e
os conflitos que surgiam disso.
Acho que havia também, por
parte do Celso Amorim, no
fundo atendendo ao desejo do
Lula, a preocupação em dar a
Lula o destaque único no plano
internacional. Aumentaram não
sei quantas embaixadas para
assegurar votos e obter um lugar
no Conselho de Segurança da
ONU – é um exemplo desse tipo
de postura.
O senhor falou do bolivarianismo do governo Lula. Mas além disso e da chamada política
Sul-Sul, o governo Lula também manteve um ótimo relacionamento com os Estados Unidos,
como é notório.
Sim, manteve. Com o governo (George W.) Bush sem dúvida nenhuma.
O que será do Mercosul, e o que o Mercosul foi concretamente até hoje?
O Mercosul é um grande projeto, em que o Brasil está empenhado claramente depois da
redemocratização. Procura fazer a melhor economia da sua geografia, busca a conectividade,
enfrenta o que naturalmente são conflitos de interesse que surgem nesse processo.
A percepção inicial do Mercosul remonta às ideias da redemocratização do presidente (José)
Sarney, que eram afirmar a democracia, resolver o problema nuclear pela criação da Agência
Brasileira de Controle de Materiais Atômicos, que acabou com a corrida armamentista pela
defesa dos direitos humanos. Você tinha a ideia, em um mundo que se globalizava e se
regionalizava, de criar uma plataforma de inserção competitiva. O Mercosul enfrentou os
desafios da falta de sincronias de políticas econômicas – por exemplo, a mudança do regime
cambial no Brasil na época do governo Fernando Henrique.
Agora, acho que os governos Lula e Dilma complicaram o funcionamento do Mercosul. A
suspensão do Paraguai e a inclusão da Venezuela foram tentativas de transformar aquilo
que era um acordo econômico e comercial em um mecanismo de aliança política. Era uma
introjeção no Mercosul de uma visão bolivariana. Então, você agregou a um mecanismo de
integração, onde sempre existem conflitos de interesses, conflitos de concepção sobre o
papel da instituição.
Eu tenho uma perspectiva mais positiva quanto ao que vem pela frente. Como eu estou
envolvido nessa história do Mercosul há tantos anos, é difícil que eu não tenha essa
REVISTA DA CAASP 19
ENTREVISTA | CELSO LAFER