maldita era uma maneira de fazer isso.
O segundo aspecto era a ideia de que o governo Lula se caracterizaria por um marco zero
em matéria de condução de política externa. É o bordão “nunca antes na história deste país”.
Acho que a preocupação maior do governo Lula foi com o prestígio do presidente, da busca
do prestígio internacional do presidente pelas características da sua carreira política, da sua
personalidade e pelos processos que ele levou adiante de inclusão social, aprofundando,
em novas circunstâncias e numa época mais favorável, o que tinha sido feito no governo do
presidente Fernando Henrique.
Mas o Brasil ganhou protagonismo internacional no governo Lula. Ou não?
Acho que sim. Naturalmente, para você ter prestígio, você precisa ter protagonismo.
O que eu quero dizer é que em matéria de política externa... eu sempre digo que a tarefa
da política externa é a de produzir necessidades internas e possibilidades externas.
Possibilidades externas significa avaliar o que você pode obter no mundo em matéria de
mercado, de segurança, de prestígio e assim sucessivamente. Em matéria de necessidades
internas, política externa não é como futebol, que tem jogadores de um lado, jogadores de
outro, um campo, regras e um juiz. Também não é como economia, que tem um objetivo
que é lidar com a escassez e como diminuí-la – há discussões sobre como fazer isso, mas o
objetivo é claro.
Em matéria de política externa, você tem distintos objetivos que respondem a distintas
situações. Por exemplo, você pode ter uma preocupação com desenvolvimento, que foi o
que caracterizou o governo do presidente Juscelino (Kubitschek), a ideia de fazer da política
interna um instrumento dos “50 anos em 5”. Pode ser com a segurança. Por exemplo, na
Coreia do Sul a segurança é um problema prioritário, também é no Japão e em Israel. Pode
ser com a propagação de ideias: na União Soviética, a ideia da propagação do comunismo era
um dos objetivos de política externa. Para o Hugo Chavez, o bolivarianismo era um objetivo
de política externa.
Dito isso, que é uma introdução teórica ao que eu quero dizer, o que o presidente Fernando
Henrique buscou mostrar é que o país tinha feito mudanças importantes, entre elas o controle
da inflação e a responsabilidade fiscal, o respeito aos direitos humanos, a preocupação com
as regras democráticas, uma procura de universalizar a educação, a implantação do SUS e o
tema dos projetos de inclusão social, como era o caso da bolsa como contemplada pela Dona
Ruth (Cardoso) no programa Comunidade Solidária.
Então, o que o Fernando Henrique queria era aumentar o prestígio do reconhecimento do
Brasil como um país capaz de encontrar caminhos para o seu destino dentro de um mundo
que se globalizada.
E Lula?
Eu acho que no caso do Lula e do Celso Amorim (ministro das Relações Internacionais nos governos
Lula), que tentou instrumentalizar isto, houve uma preocupação em atender as bases político-ideológicas
do PT. Isso significa dar um espaço grande ao professor Marco Aurélio (Garcia), que
era o assessor diplomático da Presidência, que operava uma política externa do PT, com as
suas características próprias, por exemplo, de apoio aos bolivarianos.
18 REVISTA DA CAASP
CELSO LAFER | ENTREVISTA