Revista da CAASP Tem-se a ideia de que o presidente dos Estados Unidos pode apertar um
botão e iniciar um ataque nuclear. É assim mesmo que funciona?
Roberto Godoy Não, não é. Longe disso. A única situação em que o presidente pode,
por iniciativa própria e isolada, determinar um ataque nuclear é a partir da detecção de um
ataque nuclear vindo contra os Estados Unidos. Vamos imaginar um estado de beligerância
entre Rússia e Estados Unidos, e a Rússia lança mísseis contra os Estados Unidos. Haverá
muito pouco tempo para responder a esse ataque, então essa é a única situação em que ele
pode iniciar um ataque, na verdade em retaliação a um ataque que está recebendo. É algo
entre 30 e 40 minutos, dependendo de onde venha o primeiro ataque – as hipóteses mais
prováveis seriam Rússia e China, por exemplo.
Existe uma coisa que até o cinema já imortalizou. O presidente dos Estados Unidos tem uma
sombra que nunca está a mais de 25 metros dele, em todas as situações. Todo o cerimonial
do presidente, em todas as situações, é montado de tal forma que aquele sujeito, que é
sempre um militar, portando uma mala com os códigos de ataque chamada de football, sem
nenhuma razão específica para o termo, esteja a não mais que 25 metros do presidente.
Diferentemente do que o cinema mostra, não se exige a identificação da íris do presidente
para realizar o procedimento. O militar abre a mala - há um código com o presidente -, ele
quebra o selo, o presidente dá a ordem e o ataque começa.
E no caso de um ataque nuclear planejado?
Suponhamos que os Estados Unidos decidem atacar nuclearmente outro país. O presidente
tem todo um elenco de autoridades... não que ele tenha de consultá-las, mas elas têm que
participar da decisão. São os assessores de segurança nacional, de segurança internacional,
o secretário de Defesa, enfim, há um elenco de autoridades que necessariamente tem que
participar disso.
Numa situação como essa, o sigilo é muito importante. Então, essas autoridades são convocadas,
vão para a Casa Branca, vão para o bunker da Casa Branca e não saem de lá enquanto o processo
não terminar. Há uma liturgia que tem de ser seguida.
Já que você falou do cinema, no filme “Doutor Fantástico”, de Stanley Kubrick, um general
enlouquecido deflagra um bombardeio nuclear. Isso é possível?
Esse filme é uma paródia de um filme sério chamado “Limite de segurança”, que é da mesma
época (primeira metade dos anos 1960), em que aquela situação é apresentada de uma maneira
real. Aquele quadro é o que se tinha no auge da Guerra Fria, com aqueles grandes bombardeiros
B-52. Hoje, você tem instrumentos de segurança, de filtragem, muito mais seguros e precisos.
Naquela época, satélites espiões eram um sonho, você mal conseguia colocar uma bola fazendo
bip em volta da terra.
Hoje, há movimentação de porta-aviões americanos para o Mar da China Oriental, defronte
para as Coreias. Existe risco real de conflito nuclear com a Coreia do Norte?
Há. Mas, veja, os Estados Unidos são hoje uma superpotência como nunca houve na história
da civilização - nem Roma! A diferença de capacidade é tão grande, que os Estados Unidos,
provavelmente, com uma estratégia já montada, façam algo bem antes de um ataque nuclear.
Um ataque nuclear teria implicações políticas tremendas - não é à toa que os únicos ataques
nucleares feitos até hoje tenham sido no fim da Segunda Guerra Mundial e, se você levar em
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