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Revista da CAASP - Edição n° 28

ESPECIAL 20 REVISTA DA CAASP Em dezembro de 2014, na entrevista que concedeu à Revista da CAASP, o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello repetiu o que alguém já dissera: “Somos 11 ilhas no STF”. Em princípio, nada de condenável no fato de os juízes da mais alta corte do Brasil preferirem o confinamento produtivo em seus gabinetes ao convívio forçado com quem não simpatizem. Porém, os números sugerem que, mais do que magistrados que não conversam, os ministros comportam-se cada um deles como um verdadeiro tribunal monocrático. Em agosto de 2016, foi o ministro Luís Roberto Barroso quem afirmou, numa palestra para estudantes em Brasília: “O Supremo está virando um tribunal de cada um por si. Criamos um tribunal de decisões monocráticas”. É fácil provar a asserção de Barroso. Uma pesquisa no site do próprio STF mostrará os seguintes números referentes ao ano de 2016: houve 14.529 decisões colegiadas (3.375 pelo Tribunal Pleno, 6.313 pela Primeira Turma, 4.787 pela Segunda Turma e 55 pelo Plenário Virtual); as decisões monocráticas, excluídas às do presidente da corte, totalizaram 70.091 (64.977 decisões finais, 1.748 decisões interlocutórias, 2.266 decisões liminares, 938 decisões em recurso interno e 262 sobrestamentos). Já o presidente do STF decidiu monocraticamente 32.475 vezes no ano passado. A mesma disparidade é verificada nos anos anteriores. Por que tantas decisões individuais no mais elevado colegiado da Justiça brasileira? “Foi o método que o STF encontrou para lidar com a avalanche de casos que recebe por múltiplas portas de entrada. O poder cautelar dos relatores é hoje ilimitado. Onze tribunais individuais têm maior capacidade de resposta quantitativa do que um único tribunal com 11 ministros”, ironiza Conrado Hubner Mendes, professor de Direito Constitucional da USP. “É conveniente para o Supremo dizer que, diante da imensidão de casos, não há outra maneira de decidir. Contudo, o tribunal não faz nada para minimizar as portas de entrada, e assim cria uma blindagem para a fragmentação decisória”, acrescenta. A busca da celeridade, contudo, não parece ser a única resposta para a questão. É indisfarçável o uso do poder monocrático estrategicamente. “Decisões monocráticas são úteis para os ministros, são oportunidades para cada um avançar com sua visão individual de como deve ser o direito brasileiro, em detrimento da decisão coletiva do plenário ou das turmas, inclusive quando essa visão individual vai contra a visão da maioria do tribunal”, analisa Diego Werneck Arguelhes, professor da Faculdade de Direito da FGV do Rio de Janeiro. Carlos Humberto/STF Reprodução Ministro Luís Roberto Barroso, para quem o STF está virando “um tribunal de cada um por si”.


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