Page 49

Revista da CAASP - Edição 27---

É como se ela falasse de si mesma. Desde jovens, ou meninos, a poeta já era a mesma para nós: sempre a vimos assim, marcada pelas escaras da velhice. Mas o que dela transcende e emana é uma ancianidade vigorosa e sã. Tecnicamente, gramaticalmente, ancianidade e velhice são sinônimos. Mas para ela não são, se quisermos conhecer o Coração Encarnado de Cora. Cora Coralina foi o pseudônimo que desde moça adotou Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas para diferenciar-se das outras Anas, suas conterrâneas. A cidade de Goiás, antiga capital do estado, tinha como padroeira Sant´Ana, razão pela qual muitas meninas ao nascer recebiam o nome Ana. Não querendo que a autoria de seus escritos fosse creditado a outra das Anas, adotou o pseudônimo que, segundo ela, significa Coração Encarnado, em alusão ao fato de que desnuda seu coração em seus escritos e em homenagem ao rio Vermelho, que corta a cidade passando rente ao casarão em que nasceu. Ela teve seis filhos e ficou viúva ainda moça. Para sustentar a prole, foi incansável trabalhadora. Entre outros ofícios, vendeu livros de porta em porta, linguiça e banha de porco que preparava em casa, e, por fim, ao retornar a sua cidade natal, onde morou novamente na Casa Velha da Ponte do Rio Vermelho, um casarão do Século XVIII, onde nasceu, foi doceira por mais de vinte anos. Eram famosos os seus doces de abóbora, laranja, figo e outros, que vendia de porta em porta recitando suas poesias. Essa mulher simples julgava-se melhor doceira que poeta e afirmava que fazer doces era também uma forma importante de expressão. Quando, cerca de 15 anos após a publicação de seu primeiro livro, em 1979 foi “descoberta” e elogiada por Carlos Drumond de Andrade, Cora Coralina encontra a consagração como escritora. Tinha, então, seus bons 90 anos de idade e, a partir daí, o reconhecimento bateu à sua porta para torná-la conhecida Brasil afora. Em vida a escritora publicou três livros. REVISTA DA CAASP 49 Recebeu o título Doutor Honoris Causa da Universidade Federal de Goiás e o “Prêmio Juca Pato” da União Brasileira dos Escritores como intelectual do ano de 1983. Muitos outros livros surgiram após sua morte. Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas faleceu em 1985, aos 96 anos. Cora Coralina segue viva no panteão da nacionalidade, permanecendo como exemplo de energia, força e simplicidade. | Luiz Barros é escritor e jornalista LITERATURA A casa de Cora Coralina, na cidade de Goiás. Fazer doces como forma de expressão. Reprodução


Revista da CAASP - Edição 27---
To see the actual publication please follow the link above