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Revista da CAASP - Edição 27---

Revista da CAASP – Eu estaria errado se dissesse que “O tribunal da quinta-feira”, seu último livro, trata do falso moralismo e da hipocrisia que imperam na sociedade? Michel Laub – Inicialmente, digamos que o tema geral em que eu pensei falar era “tolerância”. Dentro do tema tolerância, é claro que entra a questão da hipocrisia, da não aceitação das diferenças e de todos os grandes temas relacionados a isso que estão em debate hoje – machismo, racismo, homofobia etc. Você não acha que o debate sobre esses temas já foi mais profícuo? Dá para ver a questão por dois lados. Dentro de um espaço público que era muito mais reduzido, uns 15 ou 20 anos atrás, o nível daquele debate, em termos de etiqueta, argumentos e contra-argumentos, eu acho que houve uma involução. As pessoas estão se xingando loucamente. Mas tem um outro lado: a sociedade hoje é mais democrática, abriram-se muitos espaços - e a internet é o mais óbvio deles – para pessoas que não tinham oportunidade de se manifestar. Isso realmente causa uma impressão de rebaixamento do nível do debate. Mas tem um lado muito positivo nisso, que é a participação de muito mais vozes no debate. Antes, só participava da discussão quem passasse pelo filtro dos editores dos jornais, das televisões e um pouco da política, não só da política partidária, mas também das políticas institucionais. Era tudo muito ESTAMOS NUM mediado por quem já estava incrustrado MOMENTO nas máquinas. Hoje há uma abertura muito maior, e aí aparece de tudo. DE QUASE O que a gente está vendo neste momento OBSCURANTISMO talvez seja aquela coisa da Revolução NO DEBATE Francesa de que primeiro vem o terror, depois as coisas boas. Realmente, estamos num momento de quase obscurantismo no debate, tem gente que nem tem mais paciência para entrar no debate com medo de ser linchada. Sendo otimista, talvez seja este um momento de decantação e as coisas vão florescer mais adiante. O que você quer dizer é que o debate já existia, porém de modo restrito, e a internet abriu-o para todos? Sem dúvida, e talvez por isso o debate antes, mesmo restrito, tinha melhor nível. A mesma análise vale para a escola pública, por exemplo: a escola pública era melhor há 40 anos, mas tinha menos alunos. O nível dessas instituições, que acolhiam menos gente e gente já filtrada por uma condição econômica superior, era melhor. Mas, a situação anterior era melhor que a atual? Não. Quem são os moralistas de plantão no Brasil de hoje? Eles estão no debate público, em todo lugar. Esta discussão é sobre a autoridade de quem diz: você pode argumentar qualquer coisa, mas as pessoas olham para quem você é. É aquela coisa do argumento ad hominem. Na teoria do debate clássico, você não deve fazer argumento ad hominem, que é confrontar a pessoa em vez de argumentar. A pessoa também importa em algum nível, não em nível total. Dar opinião sobre como as pessoas vivem ou deixam de viver numa classe social hiperdesfavorecida, da qual eu não faço parte, hoje em dia causa uma desconfiança dentro do 12 REVISTA DA CAASP MICHEL LAUB | ENTREVISTA


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