Page 20

Revista da CAASP - Edição 24

A questão é se a Petrobras tem pernas para participar da exploração em todos os campos do pré-sal. Ela perdeu um pouco com esta crise. Para começar, o pré-sal foi um erro, no sentido de que, quando ele foi descoberto, não deveria se ter gerado um clima de euforia, mesmo porque não se tratava de nenhuma coisa tão maravilhosa quanto se dizia. Descobriu-se um petróleo a um custo relativamente alto, de forma que ele só seria realmente muito bom se o preço internacional do petróleo continuasse alto como foi por muito tempo. Então, a Petrobras investiu demais nessa área, apesar de não ter acontecido com ela o mesmo que a aconteceu com o Eike Batista. Ele quebrou porque apostou tudo no pré-sal. A Petrobras ficou enfraquecida, está muito endividada, e com essa crise de corrupção enfraqueceu-se também no plano financeiro interno. Que papel o senhor defende para o BNDES? Algo na linha de Luciano Coutinho ou mais no sentido do que está propondo Maria Sílvia Bastos Marques? Eu não sei o que a Maria Sílvia pretende fazer, ainda não acompanhei. Ela é uma profissional competente, respeitável. Mas a gestão Luciano Coutinho, sem dúvida nenhuma, foi muito boa, com uma ressalva: eu não teria ampliado de maneira nenhuma os recursos colocados à disposição do BNDES. Isso não foi uma decisão do Luciano, foi da presidente e do Guido Mantega. Não se deveria ter feito isso, isso teve um custo a mais que não é razoável. Agora, o BNDES é um grande patrimônio do Brasil. Quando eu digo que o Brasil não deve usar poupança externa, mas sim ter superávit em conta corrente, isso não quer dizer em absoluto que o Brasil não precise de finanças. O Brasil, como qualquer país, precisa fortemente de um sistema financeiro interno, nacional, que financie os investimentos, e a grande instituição que faz isso é o BNDES. Seria ótimo também que os bancos privados fizessem um pouco mais - estão começando aos poucos. Mas o BNDES tem papel fundamental aí. Só que surge uma questão: esse recurso subsidiado pela TJLP, a taxa de juros de longo prazo do BNDES, não é um erro? Eu digo que não, ou melhor, é um erro em si mesmo que na verdade seja um acerto para corrigir outro erro. O BNDES deveria, em princípio, financiar as empresas a uma taxa de juros baixa, mas positiva - e a taxa deles é muito baixa. Qual é o problema? Isso não foi inventado pelo Lula, já faz tempo que está aqui no Brasil. Ela se justificou quando a taxa de juros no Brasil passou a ser um escândalo, o que aconteceu a partir do Plano Real. Uma taxa de juros desse tamanho é uma violência contra os cidadãos brasileiros, que não é explicável pelo déficit público brasileiro nem pela dívida pública brasileira. Durante 14 anos, entre 1999 e 2012, o Brasil atingiu tranquila e satisfatoriamente suas metas fiscais, e no entanto a taxa de juros ficou longe de baixar o quanto deveria. Quando a Dilma promoveu uma queda na taxa de juros (2011), ela tinha que ter feito ao mesmo tempo um forte ajuste fiscal para impedir que a inflação subisse, mas esse não foi o problema fundamental. O problema fundamental é que essa baixa na taxa de juros, à qual a Dilma ainda somou um desafio aos bancos, levou a classe dominante brasileira, que é a classe de rentistas e financistas, a ficar extremamente irritada e a começar uma campanha violentíssima contra a Dilma, que a obrigou a recuar nos juros. E ela foi de recuo em recuo até sofrer o impeachment. Voltando à TJLP. Se eu tenho essa taxa de juros tão alta, isso inviabiliza completamente qualquer investimento, pelo menos das grandes empresas. Qual foi a solução? A TJLP, que conserta essa taxa de juros que é uma senhoridade dos rentistas brasileiros. Os rentistas brasileiros não ficam felizes com menos de 6% do PIB - em 2015, eles tiveram 9% do PIB. É a festa completa. LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA | ENTREVISTA 20 REVISTA DA CAASP


Revista da CAASP - Edição 24
To see the actual publication please follow the link above