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Revista da CAASP -Edição 16 - Final - 1

ação; não nos casos em que atue como fiscal da lei. Essa é a única interpretação que se pode extrair da locução “quando lhe couber intervir nos autos”. Lembre-se que o cumprimento de sentença depende de requerimento do exequente (art. 513, § 1º), que “tem o direito de desistir de toda a execução ou de apenas alguma medida executiva” (art. 775, caput). Portanto, remanesce a regra de que ninguém pode pleitear em nome próprio direito alheio, salvo quando autorizado pelo ordenamento (art. 18). Ademais, a missão do Ministério Público é a defesa do interesse social; o que não se ajusta à conduta que pretenda se substituir ao exequente. De sorte a superar qualquer controvérsia, a lei estabeleceu a possibilidade de a desconsideração ser requerida em qualquer fase do processo, inclusive e eventualmente na petição inicial – caso em que não se trata exatamente de um “incidente” (art. 134, § 2º). Isso quer dizer que a lei reconhece interesse processual (utilidade) no pleito mesmo antes que se cogite de atos de invasão patrimonial. Ao incluir pessoas no polo passivo da demanda, o autor atrai para si potenciais encargos correspondentes: se vencido, ele responderá por custas, honorários, eventuais multas e indenização por prejuízos. É bom que o interessado atente para isso antes de ampliar o polo passivo da relação processual de forma quiçá abusiva. A lei determina que a instauração do incidente acarrete a suspensão do processo (art. 134, § 3º). Mas, o sobrestamento deve atentar para os limites do pedido de desconsideração e às alegações do terceiro. Portanto, pode não haver necessidade de paralisação de todo processo. O que se deve entender é que o incidente não enseja constrição de bens com base na desconsideração até que ela seja decidida pelo juízo. Se no processo houver outras providências que não estejam relacionadas com a desconsideração, não há razão para que a suspensão extravase o objeto da controvérsia. Condicionar a invasão do patrimônio do terceiro a sua prévia manifestação não significa obstar eventual tutela de urgência cautelar em prol do credor. Portanto, mediante os requisitos próprios da tutela de urgência (art. 300), poderá ser determinado a arresto de patrimônio penhorável do terceiro supostamente responsável, antes que decidida a pretensão de desconsideração (art. 301). Tal providência, contudo, não pode ser decretada de ofício e depende de requerimento expresso e motivado do credor. A lei abre margem para que o requerimento seja feito perante o tribunal. Mas, isso só deverá ocorrer nos casos de competência originária, e não nos de competência recursal. O pleito de desconsideração e a “defesa” ofertada pelo terceiro envolvem o exercício do direito de ação. Portanto, tais demandas devem ser apresentadas ao juízo originariamente competente, ainda que a causa esteja em fase recursal e, portanto, a tramitar perante tribunal. Os casos de ações de competência originária dos tribunais estão taxativamente previstos pelo ordenamento; fora daí, sua competência é apenas recursal. Quando deduzido de forma incidental, o pedido deverá ser resolvido por decisão interlocutória. O pronunciamento desafia recurso de agravo de instrumento (art. 105, IV). Contudo, é preciso considerar a possibilidade de apreciação do pleito por sentença, não apenas no caso mais óbvio em que a desconsideração não for requerida sob a forma de incidente. Nesse caso, o recurso cabível será apenas o de apelação. Não se deve cogitar do concomitante cabimento de agravo, nem mesmo a pretexto da diversidade na disciplina do efeito suspensivo de cada um desses recursos. Se houver apenas uma decisão, deverá haver apenas um recurso. *Flávio Luiz Yarshell, advogado, é mestre e doutor em Direito Processual Civil e professor titular da Faculdade de Direito de Universidade de São Paulo. Abril 2015 / Revista da CAASP // 53


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