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Revista da CAASP -Edição 16 - Final - 1

famosos, numa estação turística nas montanhas. Dois fotógrafos de uma revista denominada Amour identificaram a cantora, que estava hospedada numa pousada, e tentaram entrevistá-la e fazer uma sessão de fotos. Yamaguchi, Shimura e Mifune: interpretações marcantes Reprodução Abril 2015 / Revista da CAASP // 45 Diante de sua negativa, armaram tocaia e conseguiram fazer uma foto dela em companhia do pintor quando ambos, que haviam acabado de se conhecer, conversavam num alpendre. A revista publicou sucessivas edições extras com a foto e histórias de um romance inventado. A situação evolui para um impasse. Ao editor da revista, que se pauta apenas pelas vendas, não interessa retratar-se, pelo contrário: ele diz que se for processado, isto aumentará seu faturamento; então o caso vai ao tribunal para julgamento. Neste ponto entra em cena o advogado (Shimura), o verdadeiro personagem central. Nele estão constelados todos os conflitos dramáticos da obra. Na sua falta de escrúpulos, na sua atuação imoral e corrupta, nas suas fraquezas e vícios, e no remorso que sente. Em comparação à força dramática deste personagem, fica pálido o maniqueísmo dos outros, sejam o pintor e a cantora, as vítimas de bom coração; seja o maldoso editor. É como se todos fossem figuras pintadas em aquarela em cores claras, servindo de fundo à marcante presença do advogado pintado em cores gritantes em tinta a óleo. É o protagonismo do advogado que nos leva a apresentar o filme de Kurosawa nesta edição da Revista da CAASP. Escândalo, geralmente considerado uma obra menor de Kurosawa, em parte passou despercebido por ter sido lançado no mesmo ano de uma de suas obras-primas, Rashomon, e por ter sido obscurecido por sua fecunda produção posterior, entre a qual encontraremos os filmes medievais de samurais. Escândalo é também um filme que enfatiza o clima pós-guerra, com constantes alusões a símbolos da ocidentalização do Japão. Talvez Kurosawa pretendesse indicar que a imoralidade retratada em parte provinha do Ocidente e que se espraiava para a sociedade japonesa naquele momento. O genial Kurosawa criou um advogado em conflito ético e moral A fotografia, em branco e preto, é muito bonita na maior parte da fita, podendo-se mesmo considerá-la de alta qualidade artística em diversas passagens, em especial nos enquadramentos que trabalham com mais de um plano. E, logo na abertura, temos um toque modernista, interessante na concepção e bem executado: uma sequencia que focaliza as rodas de uma motocicleta enquanto passam os créditos e que é cortada para a cena inicial em que Toshiro Mifune está na moto subindo a montanha em que fincará seu cavalete para pintar.


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