Page 26

Revista da CAASP - Edição 05

EENNTTRREEVVIISSTTAA \\ Recebi pressões violentíssimas do Fleury nessa época, da polícia, das entidades de classe (delegados, investigadores). Tive de tirar minha mulher de casa no oitavo mês de gravidez por segurança e levá-la para a casa de um amigo. Agora, eu não fico arrotando essas coisas, ao contrário de muitos que não fizeram nem um décimo do que eu fiz. O Tribunal só acordou após dois anos de execuções sumárias. Ainda há esquadrões da morte? Sim, há grupos principalmente na Polícia Militar. Eles resolvem ignorar o sistema e agir por conta própria, principalmente quando as vítimas anteriores são da própria polícia. Eles vão lá, detonam e fazem de conta que não têm nada a ver com o assunto. Você acha que a Comissão da Verdade descobrirá algo que ainda seja desconhecido? Eu tenho uma visão muito objetiva disso tudo. Se você quiser saber o que havia no porão, você tem de ler “Autópsia do Medo”. Embora o livro tenha tido quatro edições, muita coisa não teve a repercussão que deveria ter. Lá está escrito, por exemplo, que presos tinham as cabeças cortadas e costuradas a outros corpos; que se seccionavam dedos e saía-se à rua jogando as pontas fora. E eu digo com todas as letras: o know how da tortura na ditadura foi civil, quer se goste ou não disso. É incômodo, mas é verdade. Outra coisa que só está contada em “Autópsia do Medo” é que havia infiltração do Partido Comunista na Polícia Militar. Então, houve capitão torturado e tenente morto como o Vladimir Herzog. E ninguém se preocupa com o caso do tenente morto. Quando o governo Montoro (André Franco Montoro, governador de São Paulo de 1983 a 1987) assumiu em São Paulo, uma das primeiras coisas que aconteceu foi a extinção do Dops. O governo militar pega imediatamente o Romeu Tuma, que era diretor do Dops, e o designa superintendente da Polícia Federal em São Paulo. Na tarde da sua posse na PF, pegou fogo o serviço secreto do Dops, no quinto andar do prédio do Largo General Osório. O Tuma pegou todos os arquivos do Dops e levou para a sede da Polícia Federal. Todos os arquivos! Esses arquivos ficaram lá por cinco anos. Cinco anos! Agora, em 2013, será que vão achar alguma coisa naqueles arquivos? Não se pode pensar que os arquivos terão descrição das torturas e outras coisas bárbaras. A nossa história é contada pelos vencedores. 26 // Revista da CAASP / Junho 2013


Revista da CAASP - Edição 05
To see the actual publication please follow the link above