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Revista da CAASP - Edição 05

EENNTTRREEVVIISSTTAA \\ de uns versos do poeta Guerra Junqueiro sobre isso: “E vós dizeis: salveis a moral do templo - para todo grande crime, um grande exemplo. Mas se o seu exemplo é matar, o assassino deu exemplo primeiro”. Acho isso intrigante, mas não sei se o escrúpulo ético passa pela cabeça do delinquente, acho que ele vive num mundo à parte. Delegado Sérgio Paranhos Fleury e Cabo Anselmo, personagens de dois de seus livros mais importantes – “Autópsia do Medo” e “Eu, Cabo Anselmo”. Qual dessas figuras mais o impressiona? “Autópsia do Medo” é uma contextualização dos Anos de Chumbo. Como jornalista, vendo tudo que havia sido publicado a respeito dos porões da ditadura até então, me considerei insatisfeito. Eu vi pessoas posando de heróis, e nem todas eram heróis. Vi embates violentos, mortes, torturas, e resolvi usar meu know how profissional. Eu tenho 45 anos de profissão. Na ditadura militar, eu trabalhava no Jornal da Tarde, no período de ouro do Jornal da Tarde. Cobri muita coisa, roubo a banco, atentado ao Consulado Americano, atentado ao Quartel General do 2º Exército, a morte do Marighela, a prisão dos padres. Essas coisas, ninguém precisava me contá-las, porque estive lá, in loco. Eu vi o corpo do Marighela dentro do Volkswagen na alameda Casa Branca. Depois escutei tantas versões distorcidas sobre tudo isso que resolvi escrever o livro “Autópsia do Medo”. Tive a ideia de nominar quem tinha histórias para contar, tanto da repressão quando da militância. Fiz uma lista de 117 pessoas, e conversei com todas elas, além dos documentos que eu tinha. Deu para compor um mosaico sobre a biografia do Fleury. Era meu objetivo mostrar quem era aquele homem, como pensava, como agia contra o que chamo de guerra revolucionária. Já o Anselmo, curiosamente, me apareceu quando estava elaborando a pesquisa sobre o Fleury. Eu percebi junto a várias fontes que, ao contrário do que se imaginava, ele não estava morto, não estava fora do Brasil. Com certa persistência eu consegui localizá-lo. Então antecipei a obra, fiz o livro sobre o Anselmo antes de terminar o livro sobre o Fleury, e o publiquei primeiro. O surgimento do Cabo Anselmo decorreu de um trabalho de espionagem de altíssimo nível feito pelo delegado Fleury. Ele capturou um militante da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), prendeu-o, fez nele uma lavagem cerebral, transformou-o em seu informante e o fez continuar a manter os 24 // Revista da CAASP / Junho 2013


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